domingo, 15 de março de 2009

Capítulo XII - 1970 – CANDIDATO ÚNICO E LOTEAMENTO DOS CARGOS DA PREFEITURA

PARA A ELEIÇÃO DE 1970, surge um fato novo na legislação eleitoral, determinando que o mandato seguinte, seria de apenas dois anos a fim de que a partir de 1972, houvesse eleição somente para prefeito e vereador em todo o país, desvinculando-a dos outros cargos eletivos.
Naquelas alturas já não era tão difícil reunir os três figurões da política limoeirense visto que, todos estavam no mesmo barco, porém sem esquecer de que cada um tentava puxar a brasa para sua sardinha, necessitando apenas que chegassem a um consenso em que cada um deles tivesse o seu quinhão no bolo garantido.
Com a determinação da Lei reduzindo o mandato do próximo prefeito para um período de apenas dois anos, o deputado Franklin Chaves numa tentativa de contemporizar a sua atual situação política - que já não era das melhores - sugeriu aos demais “companheiros” da ARENA que o melhor caminho para Limoeiro do Norte seria uma candidatura única, o que evitaria uma disputa política entre as sublegendas. A partir da primeira sugestão, começaram a engendrar um acordo em que os cargos de prefeito, vice-prefeito, presidência da câmara, vereadores e secretarias municipais, fossem loteados entre eles.
Não se sabe exatamente de quem partiu a idéia, mas a verdade é que Limoeiro do Norte estava nesses termos em estágio bem mais avançado do que o próprio Estado do Ceará, que viria fazer esse tipo de loteamento somente no ano de 1982, doze anos mais tarde, com o famoso “Acordo dos Coronéis”.
Depois de muitos altos e baixos, conversa vai e conversa vem, definiram enfim o que para eles caracterizou-se como a solução de um problema político, todavia, não passou de uma maquinação estrovenga e engenhosa do trio, (Franklin, Simões e Manoel) para sustentarem suas vantagens junto ao eleitorado. E para acomodar os participantes do acordo “foram incluídas duas secretarias que figuravam na estrutura organizacional da administração municipal.” (NUNES, p. 186). Essa inventiva ideia, seria para presentear dois dos participantes: uma das secretarias ficaria com quem indicasse o vice-prefeito e a outra a quem coubesse a presidência da Câmara.
Mais uma vez Manoel de Castro levou maior vantagem quando conseguiu com que aceitassem o nome de um de seus discípulos para candidato único à prefeitura e mais uma indicação a vereador. O nome apontado e aceito, foi do Dr. João Eckner Eduardo, filho do antigo udenista João Eduardo Neto.
Ao Deputado Franklin Chaves, coube a indicação do vice-prefeito, com o nome de seu fiel aliado Professor Antônio Pergentino Nunes, além de três candidatos a vereador e a Secretaria de Finanças do Município.
Ao Dr. Simões, a Secretaria de Serviços Urbanos e a indicação de cinco nomes para vereador o que consequentemente lhe daria também a presidência da câmara municipal.
Passada a eleição, estava tudo correndo às mil maravilhas, quando surge um fato superveniente que quase chegou a melar o “acordo”. É que o MDB, já com representação no município, elegeu para vereador pela sua legenda Lírio Remígio, muito ligado ao grupo político liderado por Manoel de Castro e que juntamente com mais alguns elementos, tramava violar o que ficara acordado com referência à eleição para presidente da câmara, votando em um outro nome que não fosse aquele que faria parte do grupo de Dr. Simões. Realmente o movimento aconteceu, sendo que não se concretizou no final da eleição por causa da interferência do prefeito Eckner e seu vice Pergentino, encarregados de fazer cumprir o que fora estabelecido pelos três deputados.
Mesmo aceitando todas as imposições no afã de salvaguardar seus espaços políticos, Franklin e Simões não escaparam da fúria de Manoel de Castro que sentindo sua vantagem em relação a eles, iniciou por reforçar seu próprio grupo se tornando forte e praticamente imbatível. Foi a partir de 1970 que Castro detonou todo o seu populismo unido a um forte fisiologismo, características marcantes de toda sua vida pública, percebendo que tinha em mãos armas poderosíssimas para confeccionar votos. Com as vantagens a seu favor, não foi tão difícil levar ao ostracismo os seus dois adversários, sem chances inclusive de meter o nariz nas decisões políticas do município daquele momento em diante.
Dessa forma, aflorava-lhe todo o poder e perspicácia política, transformando-se no “Coronel” mais famoso da historia de Limoeiro do Norte e porque não dizer, do Vale do Jaguaribe. Com seu enorme prestigio junto a Virgilio Távora, por sua vez muito prestigiado pelo governo dos militares, o régulo Manoel de Castro passou a usufruir desse estágio para criar na região jaguaribana um dos maiores currais eleitorais onde ele reinava como um imperador.
Desde então, Franklin Chaves e Simões dos Santos, começaram a perder forças gradativamente. Nenhum dos dois conseguiu mais se eleger a deputado. O primeiro abandonou a política, passando a visitar Limoeiro esporadicamente até falecer em 1992 e o segundo, ficou ainda tentando manter-se – em vão – em atividade.
Houve um acontecimento durante o período Eckner que podemos considerá-lo como um fato até certo ponto pitoresco e muito comum entre os políticos. Contam que existia um grupo de pessoas interessado em que o Professor Pergentino não saísse candidato a vereador nas próximas eleições em virtude de ser bem votado e com isso atrapalharia a votação de alguns outros candidatos. Para que isso acontecesse, era necessário se criar um fato que tornasse a candidatura de Pergentino impedida. Nesse ínterim e sabendo-se da sua sempre disposição e “orgulho” em assumir a prefeitura nas ausências do prefeito, os contra à sua candidatura a vereador maquinaram uma trama, evidentemente em combinação com Eckner, em que ele assumisse, sem atentar para o prazo em que isso não poderia ocorrer. Obcecado pela investidura do cargo de prefeito interino, Pergentino esqueceu completamente de que havia um período contado antes da eleição em que, se ele substituísse o prefeito dentro desse período, ficaria impedido de candidatar-se a vereador. Quão grande foi a sua decepção, sentindo-se traído pelos próprios amigos e como consolo resolveu candidatar às pressas mais uma vez a sua irmã Leonila, facilmente eleita naquele pleito.
Podemos afirmar que durante aqueles dois anos, Limoeiro do Norte teve dois prefeitos ao mesmo tempo, caso inédito nas administrações públicas. De acordo com o Professor Pergentino, ele é também merecedor de ser considerado PREFEITO, alegando que assumiu o cargo por quase a metade do mandato.
Tão grande e fora de propósito é esse disparate que o vice-prefeito que se autodenominou o verdadeiro chefe do executivo, chamando para si todos os “méritos” daquela administração, alegando que assumiu o cargo, durante 237 dias, portanto, quase metade do mandato do próprio prefeito Eckner que solicitou uma CERTIDÃO(*) atestando o tempo em que, embora de forma interina e alternadamente assumiu o executivo municipal.


Estado do Ceará
Prefeitura Municipal de Limoeiro do Norte
CERTIDÃO
Certificamos, para os fins que se fizerem necessários, atendendo solicitação da parte interessada, que, revendo os livros de registro de termos de posse e transmissão de cargo de prefeito municipal, no período de 1970 a 1972, ficou constatada a permanência no cargo de prefeito, por ocasião do afastamento do titular do cargo, na época João Eckner Eduardo, cujo mandato teve curso de 25/03/72 a 30/01/1973 e senhor Antônio Pergentino Nunes, eleito vice-prefeito para o mesmo período, que assumiu, de maneira alternada, o poder executivo municipal durante duzentos e trinta e sete dias, ou seja, sete meses e vinte e sete dias.
Prefeitura Municipal de Limoeiro do Norte, dezesseis de maio de 1984.
José Galdis de Lima Bandeira
Secretário de Administração e Finanças.
Visto: data supra
José de Oliveira Bandeira
Prefeito Municipal

Em virtude disso, tempos depois conseguiu mais uma vez acionar o seu poder de persuasão e convenceu o prefeito João Dilmar a colocar sua foto na galeria dos prefeitos de Limoeiro do Norte. E lá estão as fotos: Eckner e Pergentino com períodos iguais de mandato. - E foi mais a além, quando exigiu que a colocação da foto, fosse precedida de um evento em sua homenagem, com a participação das comunidades política e social limoeirenses.

Um outro acontecimento vergonhoso na administração Eckner, mas que exaltado como um grande feito pelo Professor Pergentino – com destaque nas suas memórias, (NUNES, Antonio Pergentino. “Minha Vida... Minha Luta...”, pgs. 189 a 192) – o vice-prefeito que se julgava prefeito relata com orgulho e clareza o extermínio de praticamente todos os pés de ficus-benjamins existentes na zona urbana da cidade.
Tombadas muito mais pelas cutiladas da ignorancia, do que mesmo em razão do motivo com que alegava para que tamanha afronta fosse praticada contra as belíssimas arvores, a verdade é que não passou de um gesto insano, tão somente porque as culparam pela praga dos mosquitos chamados lacerdinhas.[*] Esse tipo de desvairamento, comum em alguns políticos vaidosos, ultrapassa não raramente, os limites da insensatez e do ridículo.
A administração pública, em vez de tentar eliminar os incômodos insetos que se abrigavam nas folhas, tomou a decisão de tombar ao chão as frondosas árvores que ornamentavam as praças e avenidas da cidade. Colocou em prática o adágio popular que diz: “em vez de matar os carrapatos, preferiu matar a vaca para eliminar os carrapatos”.
[*] São insetos pequenos, que se desenvolvem nas folhas das árvores (ficus). Caindo nos olhos causa um grande ardor, embora de efeito rápido e sem nenhum problema.
"Vez em quando, as árvores inofensivas sofrem horrores através da ignorância dos homens, principalmente de quem tem o dever de preservá-las. Na natureza, com suas diferentes formas elas não só impressionam como inspiram aos poetas e trovadores, enaltecendo sempre a sua prazerosa sombra de abundantes folhagens que servem ainda de abrigo saudável aos homens e animais.
Lembremos os enormes, mas graciosos tamarindos, que costumeiramente faziam parte dos terreiros das casas em Limoeiro. Alguns, gigantescos enfeitavam o centro da cidade. Um deles ficava na (hoje) Praça Mamede de Oliveira e dois em frente a casa do Cel. Francisco Remígio na Rua Cônego Bessa, esses últimos imortalizados por Carmelita Setúbal que os conheceu na sua infância e que segundo ela:

“...viram a graciosa cidade de Limoeiro ainda menina, e envaideceram-se com ela adolescente e bonita. [...] Uma noite desapareceram. Duas tochas enormes iluminaram as trevas da noite transformando-os em pequeninas fagulhas que luziam e desapareciam enfeitando a noite da cidade que dormia. O progresso condenou-os pelo fogo, e condenando-os sacrificou-os”. (SETÚBAL, Crônica apud LIMA L. d., 1987, p. 417)

A história registra que os belos tamarindos foram incendiados por ordem do prefeito Raimundo de Castro em nome da modernidade e do progresso, mas dizem também que foi em razão de uma briga política.
Os limoeirenses, bem que poderiam consagrar a linda carnaubeira como seu maior símbolo. Depois de haver enriquecido muitos proprietários rurais e tendo a cera perdido o valor de ouro em pó, passou a ser vítima do progresso.


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Se até agora temos percebido que a história política de Limoeiro do Norte tem sido uma sucessão de interesses individuais dos políticos, acabamos de comprovar com o que aconteceu na eleição de 1970.
A propósito, não compreendemos como Dr. Simões depois de ter se revelado uma das figuras mais importantes no cenário político limoeirense, sobretudo por ter derrotado historicamente o PSD e a UDN em 1958 numa eleição espetacular, tenha se distanciado do povo. Se tivesse sido persistente, teria assegurado sua popularidade e seu peso eleitoral, contudo, preferiu fazer política distante de suas bases o que certamente lhe remeteu ao ostracismo como sempre desejou Manoel de Castro.
Que houvesse uma eleição para uma única candidatura, isso teria sido justificável e até louvável pela feliz idéia, agora, o inadmissível era que pegassem a prefeitura e a câmara municipal e jogassem no “pano” para que fossem designados os lotes numa vergonhosa partilha.
E muito peculiar aos políticos descambar para esse lado negro, triste e podre da política, deixando em plano muito inferior o eleitor, quando deveria ser considerado o elemento mais importante de uma eleição.
O acordo surgido para que se loteasse as posições, os cargos e os órgãos públicos, indicava que a fragilidade mediante ao eleitorado de Franklin Chaves e Dr. Simões, era evidente e por isso temiam pela ascensão de Manoel de Castro. Este por sua vez tinha consciência de sua superioridade sobre os outros dois e não se abstinha em fazer parte dessas costuras vergonhosas mostrando que seus interesses não eram em nada diferentes.
Se Franklin Chaves sugeriu uma candidatura única, estranha-se portanto ter aceitado o nome indicado por Manoel de Castro e um dos motivos talvez era porque sabia perfeitamente que numa disputa normal sairia derrotado. Melhor seria garantir sua participação no processo se conformando com a indicação de três vereadores e a secretaria de finanças. Já o Dr. Simões, foi o mais beneficiado, pois seu peso político já não era tanto e abocanhou a presidência da câmara e mais uma secretaria.
Todo aquele “saco de gatos” encenado pelos políticos locais em conluio com os estaduais, nos faz ver que é comum na política o uso de montagens cerebrinas, que deixa sempre o povo alheio ao processo e, na maioria das vezes impedido de conhecer o que se passou verdadeiramente na intimidade dos “apertos de mãos” que desencadeia geralmente em soluções que somente aos políticos interessam. O que se pode deduzir dessa passagem é que nenhuma daquelas lideranças teve a coragem de partir para o confronto, nenhum deles confiou no seu respaldo junto ao eleitor, dando-lhe o direito de escolher livremente um candidato. Antes, temeram por uma derrota e optaram em não apostar na popularidade e em contrapartida, se destinaram a dividir o município como se eles fossem seus donos.
A vergonha de um acordo dessa natureza nos faz lembrar o já citado “Acordo dos Coronéis” em 1982 entre Virgilio Távora, Adauto Bezerra e César Cals, quando nas mesmas condições lotearam o Estado do Ceará em 33% dos cargos para cada um deles. Incrivelmente Limoeiro do Norte antecipou essa humilhação ao povo.
Ora, se os líderes maiores da política limoeirense estavam todos em um mesmo partido significava que numa disputa isolada, aquele que tivesse o seu candidato vitorioso trataria de massacrar os perdedores impiedosamente. Em 1970, o cenário político limoeirense foi transformando em um palco, cada um na busca desesperada de abocanhar a melhor fatia. Nenhum dos três se escusou de participar da urdidura de acordos e conchavos vários, despreocupados evidentemente com a situação do povo, mesmo porque, este sempre foi castrado nos seus direitos.

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