segunda-feira, 16 de março de 2009

Capítulo XVII - 1ª GESTÃO DO CARECA - 1983/89

AO ASSUMIR A PREFEITURA o Careca sentiu-se inteiramente à vontade e cheio de vaidades, quem sabe pensando substituir a liderança de Manoel Castro, certo de que este teria encerrado a sua vida pública com a última eleição.
Com a pretensão de despontar como uma “nova” liderança, deu o pontapé inicial para o surgimento de um novo CICLO POLÍTICO, açambarcando para si o papel de mentor principal além de implantar uma forma de governo totalitário e altamente centralizador.
Em pouco tempo transformou-se numa figura ambiguamente popular e tornou-se famoso ao registrar a sua marca como governante pelos murros que dava na mesa de seu gabinete quando necessitava lembrar que “era ele quem mandava”.
Grosseiro no falar e áspero no modo de tratar as pessoas costumava colocá-las em um patamar inferior e na maioria das vezes com um tom fortíssimo de deboche, abusando de sua autoridade para aferir aos outros títulos como “doutorzinho, fulaninho, advogadozinho de merda” etc. Por isso e por aquilo, passou a ser odiado por uns e reverenciado por outros e foi com essas atitudes que não tardou a ser considerado de que Limoeiro finalmente descobrira o seu grande administrador.
Aquele que se revelou em 1976 como um autêntico líder em defesa de um povo e com a intenção de derrotar o império de Manoel de Castro em Limoeiro, voltou para se transformar num dos políticos mais insensíveis conseguindo ainda ser visto como o maior representante do povo no momento. Mal sabia ele que iria passar para a história como aquele que iniciou a confecção de um “bolo” o qual teve que dividi-lo com quem tanto subestimou durante o seu mandato.
Comandou a prefeitura com absoluta centralização de poder e não admitia por hipótese alguma que opinassem sobre o que ele devia ou não devia fazer, dispensando totalmente qualquer tipo de assessoria e, se existisse era somente para dizer amém aos seus atos.
Se determinasse ao Setor de Compras a aquisição de algum móvel ou imóvel – um carro, por exemplo – e o responsável por aquele setor ao verificar na Contabilidade não haver mais cobertura orçamentária, comunicava-lhe a impossibiidade de fazer a compra. Nesse caso, respondia irritado que “se virasse”, numa clara demonstração de arrogância e também de ignorância, já que não entendia mesmo "desse negócio de dotações orçamentárias".
Para se ter uma idéia de que ele era o dominador da rotina administrativa, que a prefeitura dispunha apenas de um aparelho de telefone e esse, fixado em sua própria mesa, sendo ele inclusive quem o atendia. Era uma forma de centralizar todos os assuntos e tomar conhecimento do que estava querendo uma pessoa ao ligar para a prefeitura, e dependendo da informação solicitada, respondia com extrema ignorância e estupidez.
Ninguém, ninguém mesmo, tinha o direito de fazer qualquer coisa, ou autorizar quaisquer despesas até as mais insignificantes e fora das funções de um prefeito – um maço de pregos, um carro-de-mão, um quilo de arame etc – que não fosse ele próprio quem o comprasse.
Semi-analfabeto, porém muito esperto e arguto e ainda favorecido pela reformulação na distribuição de recursos para os municípios através do FPM (Fundo de Participação dos Municípios) quando teve a cota aumentada consideravelmente, instalou na prefeitura uma verdadeira construtora, adquirindo caçambas e máquinas de terraplanagens além de vários veículos.
Inteligentemente, camuflou a administração com uma aparência de modernidade, sobretudo na reforma das praças do centro da cidade e priorizando as estradas vicinais do município, sabendo que isso lhe renderia muito politicamente, tanto que foi o suficiente para ser considerado um excelente administrador.
Pode-se considerar como sua grande obra a reconstrução do Mercado Público, que havia passado uma reforma na gestão de Júlio Eduardo no ano de 1918 e a última em 1948, pelo prefeito Estevão Remígio. Mandou retirar as velhas cruzetas de madeira substituindo-as por estrutura metálica, modificando totalmente a parte interna, porém conservando as fachadas laterais.
Com ele, também se estabeleceu um império de empreguismo nunca visto em Limoeiro do Norte e a prática do nepotismo ficou patenteada através de cargos assumidos por seus parentes e aderentes. Nomeou para o cargo de Secretária de Administração a filha Lúcia, conhecida pela antipatia e arrogância e para o Setor Financeiro o filho Gladis, uma figura ligeiramente simpática e de baixíssima popularidade.
Também foi na sua administração que surgiram boatos de corrupção, superando todos aqueles de que se tinha notícia até então.
Para completar, a sorte lhe ajudou quando o Congresso Nacional teve a idéia de espichar os mandatos dos prefeitos dos municípios por mais dois anos voltando novamente as eleições para prefeito e vereadores separadas dos outros cargos.
As distorções dentro da administração levaram a Câmara de Vereadores a implantar uma oposição fiscalizadora dos atos do executivo que embora sendo minoria, conseguiu levantar denúncias levando ao conhecimento da população alguns atos de desmandos administrativos.
A vereadora Rita Peixoto, na qualidade de Presidenta da Câmara encabeçou essa oposição, mesmo tendo sido sua forte aliada na campanha e agora, praticamente sozinha não tinha forças suficientes para combater o forte poder do Careca.
Para ter uma maioria esmagadora no colegiado da Câmara Municipal, corria à boca pequena de que alguns vereadores recebiam propinas por parte do prefeito, para permanecerem calados sobre as denúncias ou defendê-las se fosse o caso, bem como votarem a favor das matérias enviadas pelo executivo. Desde então, a Câmara Municipal praticamente por inteira, passou a viver às voltas de um esquema de favores e contra-favores, facilitando a ação do executivo sobre os edis e o compadrio, o fisiologismo e o assistencialismo tornaram-se práticas corriqueiras no poder Legislativo Municipal. Por sua vez, grande parte dos vereadores estando corrompida esquecia o compromisso para com o povo e o vicio da gorjeta tornou tão comum que alguns deles chegaram ao descaramento de colocar preço no voto, sujeitando ao executivo a dispor de numerário para aprovar as suas matérias. Um desses vereadores chegou inclusive a declarar numa entrevista de rádio que o seu voto no parlamento estava sempre à venda e o fazia como se fosse uma prática legal.
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E foi nesse clima negro que teve inicio um dos períodos mais conturbados da história política de Limoeiro do Norte. Começava naquele ano de 1982, aquilo que podemos denominar de “CICLO DOS AMIGOS’, pois, muito embora todos eles viessem de uma origem, ou seja, eram crias de Manoel de Castro, mas o encerramento da vida pública do “velho guerreiro” proporcionou uma nova fase na política limoeirense.
Vamos perceber doravante, que os que compunham o “CICLO DOS AMIGOS”, ultrapassaram todos os limites do respeito ao povo e não se abstiveram de costurar acordos espúrios e negociatas nas caladas da noite, muitas vezes vendendo o eleitorado como se fosse boiada em troca de vantagens individuais ou de grupos.
Sem o menor escrúpulo, passaram a praticar promessas demagógicas e vamos ver que a cada eleição, a cada campanha política a situação tornava-se cada vez mais deprimente.
Nenhum deles se absteve de participar dos sucessivos conchavos e vergonhosas negociatas. Interessante que o discurso feito era para mudar o sistema, o que não acontecia, visto que era alimentado exatamente pelo jogo que eles praticavam, o que sustentava a manutenção do poder, ora com um, ora com outro, através da manipulação dos mecanismos eleitorais, garantindo assim seus próprios interesses.

Virou rotina entre todos eles, brigarem desesperadamente numa eleição e se unirem desavergonhadamente em outra.
Em função disso, a vontade do povo continuou sendo condicionada e manipulada por opiniões e atitudes que apenas a eles interessavam.
Os mecanismos democráticos foram vergonhosamente violados e corrompidos a cada eleição pelos fazedores de opiniões e condicionadores de candidaturas. Da mesma forma continuaram usando somente daquilo que lhes conviessem e, os candidatos que se seguiram foram também comprometidos.

A gestão de Gladstone Bandeira foi marcada principalmente pela prática do empreguismo, do nepotismo, do autoritarismo e dos boatos de corrupção na administração municipal, além das suspeitas de pagamento de gorjetas a alguns vereadores. No caso em foco e se os boatos tiveram realmente algum fundamento, lamentavelmente temos que admitir que aqueles que se venderam e se curvaram ante o dinheiro recebido não fizeram mais do que alimentar uma política de interesses individuais, além de ser uma atitude inteiramente aética, servil e mercenária, se enquadrando no sábio pensamento do Barão de Itararé que diz: “O homem que se vende recebe sempre mais do que vale”.
A frase se encaixa principalmente em se tratando de quem detém um mandato através do voto popular. É inaceitável que aquele que se diz representante do povo descambe para o caminho da corrupção a fim de se locupletar às custas da boa fé de uma gente tão carente de lideranças.
A verdade, é que com propina ou sem propina, alguns vereadores não tiveram a preocupação em transformar a Câmara Municipal numa espécie de secretaria do executivo com o agravamento de que as relações políticas colocaram em segundo plano o tão importante papel do Legislativo dentro da democracia.
Evidentemente que se não fosse um escasso número de vereadores que não aceitou se corromper, a Câmara teria sido inteiramente manobrada, com a utilidade apenas de ser subserviente ao poder executivo. Esses pouquíssimos heróis incorruptíveis sempre presentes salvam continuadamente os interesses do povo e o que a ele pertence, muitas vezes enfrentando uma maioria corrupta, desoladora e devastadora de consciências alheias.
A prática vergonhosa da propina nesses casos direciona sempre para um outro absurdo: se intensifica a exploração das pessoas, sobretudo nos momentos de eleição. Ao seguir essa prática, os políticos ao invés de vangloriarem-se como representantes do povo, deveriam sentir vergonha de si mesmos.
ELEIÇÃO PARA GOVERNO DO ESTADO - 1986
Com a aproximação das eleições estaduais de 1986 o governador Gonzaga Mota, mesmo rompido com os Coronéis, começou ensaiar o seu apoio ao vice-governador Adauto Bezerra para sucedê-lo no governo do Estado, entretanto, estranhamente anunciou depois que apoiaria não mais Adauto e sim Mauro Benevides do PMDB. Mais estranho ainda foi quando em poucos dias, Mota deixou de lado o nome de Mauro Benevides e lançou a candidatura de Tasso Jereissati, um jovem empresário, filho do senador Carlos Jereissati e um estreante na política.
Vamos lembrar que naquele tempo existia no Ceará um grupo de jovens da elite empresarial cearense que ingressara no final dos anos 70 no Centro Industrial do Ceará-(CIC), sendo eles, Tasso Jereissati, Beni Veras, Amarílio Macêdo, Byron Queiroz e os primos Assis Machado e Sérgio Machado. Além de outras coisas o CIC começou a agendar a política em suas discurssões com a intenção de se preparar para um dia tomar o poder dos coronéis no Estado.
O convite do Governador Gonzaga Mota para que Tasso Jereissati fosse candidato ia de encontro ao consenso entre todos os que compunham o CIC de que não era o momento certo para concorrer a uma eleição, pois segundo eles, ainda não estavam preparados, não obstante era comum o entendimento de que o Ceará precisava de um governo moderno em que a sociedade através de suas representações pudesse participar ativamente contribuindo para as decisões administrativas. Por esta razão é que aceitaram o convite do governador e através de Amarílio Macedo trataram logo de organizar um movimento denominado PRO-MUDANÇAS que consistia na montagem de um modelo administrativo para o Estado, caso Tasso viesse ganhar a eleição.
A campanha já se iniciou com um grande problema. O candidato Tasso Jereissati criticava contundentemente a política arcaica e cruenta dos coronéis, enquanto indiretamente tecia criticas à situação deplorável em que se encontravam os cearenses naquele momento, classificando o Estado como sendo de um povo miserável por culpa dos últimos governos. Ao se expressar dessa maneira, Tasso atingia inclusive o governo de Gonzaga Mota, ainda mais quando em seus pronunciamentos demonstrava-se revoltado dizendo que pretendia acabar com aquela miséria afirmando categoricamente: “O Estado nunca esteve a serviço do povo e que é preciso mudar”.
Mota desgostou-se, principalmente depois das insinuações de que ele estava atrapalhando a campanha do candidato peemedebista, confirmando sua insatisfação numa declaração ao Jornal do Brasil, quando disse:
"Estão dizendo por aí que eu sou um fardo pesado. Então, se pensam assim, por que vou me oferecer? Caso não queiram a minha participação, ficarei afastado da campanha". (Apud: www.noolhar.com/opovo/politica - Em 03.07.2003)
Por outro lado, a campanha dos Coronéis – novamente estavam todos unidos Adauto, César e Virgílio – era totalmente montada em cima da desorganização administrativa do governo de Gonzaga Mota com denúncias de nepotismo e de irregularidades nas contratações.
O clima ficou mais tenso, quando o candidato a vice-governador na chapa de Adauto Bezerra, Deputado Aquiles Peres Mota, fez acusações ao pai de Tasso, Senador Carlos Jereissati de desonestidade no mundo dos negócios.
Carlos Jereissati – eleito Deputado Federal em 1954 e 1958, Senador em 1962. Faleceu em 1963, aos 46 anos de idade de infarto.
O povo entendeu como sendo uma covardia, atacar um homem, inda mais depois de morto, no que levou ao PMDB usar isso como estratégia em seus programas eleitorais. Foi exatamente a partir dai, que o grupo dos coronéis começou a cair nas pesquisas, que até então davam vantagem de 37% de Adauto, contra 30,6% de Tasso.[2]
Os peemedebistas usaram as declarações de Aquiles Mota, para divulgar imagens do Senador Jereissati juntamente com Tasso ainda bastante jovem, acompanhadas da música “pai herói”, criando cenas emocionantes e de comoção que muito contribuíram para a reversão dos votos e em poucos dias Tasso atingiu 36% contra 26% de Adauto. Com a divulgação desse resultado as bases dos coronéis começaram a rachar e antigos partidários, muitos deles há mais de vintes anos ligados ao grupo coronelista decidiram apoiar Tasso.
Em Limoeiro do Norte, a maioria das lideranças políticas, apoiava Adauto Bezerra, tendo em vista de que era raro aquele que não se enquadrava na política dos coronéis, sobretudo pela influência de Manoel de Castro.
Rios de dinheiro corriam para as mãos dos líderes políticos locais e o representante maior de Adauto no município era Wilson Craveiro Holanda. Embora não mais manoelista, obedecia cegamente a política dos coronéis e sua residência na rua Cel José Nunes transformou-se num comitê pró-Adauto.
Enquanto isso, outras lideranças mais independentes, porém em menor número, optaram por apoiar a candidatura de Tasso Jereissati, inclusive o empresário Gerardo Lucena de Oliveira, um tradicional seguidor de Manoel de Castro.
Vale ressaltar que na região jaguaribana, principalmente em Limoeiro do Norte, os coronéis foram fragorosamente derrotados deixando a impressão de que a força de Manoel de Castro já não era tão eficiente como antes.
No final da campanha, Tasso elegeu-se com 52,32% contra 30,01%[3] de Adauto Bezerra. Mais ainda, o PMDB elegeu os dois senadores Mauro Benevides e Cid Carvalho.
Foi a partir de 1986, que se fechou o ciclo da era dos “coronéis no Ceará” mesmo assim e demonstrando ainda um certo poder, César Cals elegeu o seu filho César Cals Neto e Virgilio o seu Filho Carlos Virgílio, ambos para a Câmara dos Deputados. 
INÍCIO DA ERA TASSO 
A “era Tasso” começou num clima de muita expectativa, pois se esperava na verdade que aquele modelo arcaico e cruento dos coronéis tivesse chegado realmente ao fim e que o Ceará se projetasse com um governador jovem, dinâmico e acima de tudo, honesto.
Ao iniciar o seu governo, Tasso Jereissati teve de enfrentar uma tradicional estrutura política montada pelos coronéis, os quais detinham em suas mãos até aquele instante, no mínimo 115 municípios do total dos 151.
Começou a administrar o Estado como se estivesse administrando uma empresa e bombardeando contundentes declarações de que “não tinha um tostão para nada” e que “encontrara um Estado falido”, na verdade, já devendo três meses de pagamento do funcionalismo e uma arrecadação totalmente comprometida. Resolveu tomar algumas medidas que sabia ser desagradáveis, mas que viriam resolver sérios problemas administrativos inclusive no setor de pessoal a fim de acabar com o vício de alguns servidores em “receber dinheiro do Estado, sem dar expediente”.
Não levou para dentro da administração nem um resquício ou marca da administração de Gonzaga Mota, mesmo tendo sido o inventor e patrocinador de sua candidatura. Pelo contrário, em pouco tempo, Mota teve que engolir um duro rompimento e, seu governo passou a ser tratado como igual ao dos coronéis, portanto, de nada servia como modelo para a nova administração.
Estabeleceu inicialmente uma ruptura com as práticas viciosas e politiqueiras implantadas pelos coronéis criando um modelo administrativo em que os favores e contra-favores praticamente deixaram de existir. Ninguém, por mais importante que fosse, conseguia facilmente falar com o governador da forma como acontecia antigamente, quando deputados e chefetes políticos municipais adentravam ao palácio da Abolição e passavam horas e horas no gabinete do Governador tomando cafezinho e jogando conversa fora.
A partir de então ficou conhecido o famoso “chá de cadeira”, significando que qualquer um político que pretendesse ter uma audiência com o governador teria que esperar no mínimo umas duas horas sem contar que muitas vezes nem recebido era, – dependia muito do assunto a tratar – mesmo depois de ter passado tanto tempo esperando.
Mas se por um lado, o Estado voltou a ter credibilidade e notabilidade nacional, por outro, a miséria não mudou em nada. Através da modernidade administrativa, do equilibrio fiscal e da recuperação da economia e das finanças, o Estado passou por uma profunda mudança na cultura política, representando uma alteração também profunda. Mas nem por isso, os altos índices de miséria e pobreza, de desemprego e concentração de renda, deixaram de fazer parte da real situação do povo cearense.
A montagem de um fortíssimo esquema promocional, levou a mídia a propagar um governo de características sérias, todavia, ocultava por trás das bem montadas propagandas, uma cruel realidade: o povo continuava miserável. Tanto usou fortemente a propaganda que os recursos destinados para fins publicitários do governo foram altíssimos, numa demonstração de que havia uma intenção de mostrar ao restante do país cenas que não correspondessem inteiramente com a verdade.
[2] Dados da Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura – Em 03 07.2003
[3] Fonte: http://www.tre-ce.gov.br/tre/eleicoes - Em 03.07.2003

Capítulo XVI - A ELEIÇÃO DE 1982 - CARECA X WILSON HOLANDA


UM DOS MOMENTOS mais movimentados políticamente em Limoeiro do Norte, foi o período que antecedeu as eleições de 1982.
Os fatos corriqueiros em se tratando de política, aconteciam sempre em torno de todo o grupo de Manoel de Castro, já que os grupos de Dr. Simões e Franklin Chaves estavam praticamente enterrados, afora dona Judite que inutilmente teimava em manter a sua liderança.
Sendo Manoel de Castro o governador do Estado, pretendeu naquele ano, fazer uma campanha nos municípios nos quais ele tinha respaldo eleitoral de modo que viesse fortificar o esquema montado por ele e VT, na retomada das prefeituras. Nomeou para as Secretarias de Administração e Casa Civil, o Dr. José Maria de Oliveira Lucena, rapidamente denominado pela imprensa de supersecretário, quando até então ocupava o cargo de Procurador Jurídico da prefeitura.
Como era de praxe, sempre que se aproximavam as eleições se iniciavam as conversas em torno de quem seria o candidato, razão pela qual surgiam os interesses daqueles que detinham poder de barganhar alguma coisa. Muitos políticos encostaram-se ao chefe cada vez mais servis e com a aproximação das eleições se acentuou essa subserviência, por conseguinte, foi sendo criada também uma área de atrito numa disputa de quem tinha ou de quem não tinha mais cartaz, mais privilégio, junto ao chefe.
Tinha o governador o objetivo de ganhar as eleições não somente em Limoeiro do Norte, mas também em Morada Nova e outros municípios da região. Orientou o Dr. José Maria Lucena para trabalhar nesse sentido, transformando-se a partir daquele momento em um astuto e versátil negociador dos malabarismos políticos. Transformou-se ainda no principal articulador para a sucessão de Evaldo Holanda obedecendo e seguindo a doutrina e princípio do chefe que costumava a dizer: “a única coisa vergonhosa em uma campanha política é perder a eleição e nada mais”.
Por outro lado, Antônio Holanda de Oliveira, “o velho da serra” que há algum tempo já vinha arrepiado com Manoel de Castro, decidiu candidatar-se para concorrer naquela eleição. Para desagrado do governador e levando a sério seu intento, começou a visitar alguns correligionários externando sua intenção de novamente dirigir o executivo municipal. Devido essa atitude, foi aconselhado por Dr. José Nilson Osterne com a seguinte frase: “cuidado Antônio, pois começando cedo assim, no final você terá vendido o último forno de cal”.
Mas o destino foi cruel com o Velho da Serra. Sua intenção foi barrada por uma enfermidade que o impediu de prosseguir na campanha, obrigando-se a colocar seu filho Wilson Craveiro Holanda no seu lugar. Com Wilson candidato, a oposição de Manoel de Castro tornou-se mais acirrada, pois teria dito em conversas informais “que Wilson jamais seria prefeito se dependesse dele”.
Na época se ouviu um boato de que uma das razões pela qual Manoel de Castro se impôs contra os nomes de Antônio Holanda e Wilson se qualquer um dos dois fosse candidato, foi por sugestão e até imposição do seu supersecretário Dr. José Maria Lucena, o qual conservava alguns arranhões e atritos pessoais com Wilson Holanda.
Mesmo doente, e ainda resistindo com a fibra que sempre fez parte do seu caráter, Antônio Holanda decidiu partir para a briga, para o confronto, embora consciente de que a sua avançada idade e a enfermidade não lhe permitiriam envolver-se em mais uma campanha política.
Gladstone por sua vez, interessava encostar-se ao governador mostrando que mesmo tendo sido derrotado por ele nas eleições passadas, tinha atrás de si uma legião de eleitores que seguia à risca as suas orientações políticas. Numa verdadeira demonstração de falta de respeito ao povo e de que pouco lhe importava o senso de moral nas habilidades para conseguir o poder, voltou ao seio de Manoel de Castro, prometendo esquecer totalmente tudo o que dissera e fizera quando com ele rompeu em 1976. Aliás, essa passaria a ser a característica mais peculiar do Careca: nunca se abster em participar de conchavos e acordos a fim conseguir seus objetivos políticos.
Com a ideia implantada na cabeça de que sem a máquina administrativa ninguém consegue chegar à prefeitura, Gladstone conseguiu o apoio tanto do governo do Estado na pessoa do governador Manoel de Castro quanto do governo do município na pessoa de Evaldo Holanda Maia. O nome do candidato a vice-prefeito de Gladstone por sugestão de Raimundo de Castro e Silva e com o respaldo de dona Osmira e facilmente aceito por Manoel de Castro recaiu sobre o jovem odontólogo João Dilmar da Silva, uma figura inteiramente desconhecida dos limoeirenses, sem nenhuma experiência, totalmente avesso e alheio à política além de um fraquíssimo orador de palanque. Sua indicação era somente mais uma demonstração de que colocavam nomes como candidatos conforme suas vontades, pouco importando se representavam os anseios do povo.

Com o lançamento do nome do Careca, Antônio Holanda não se intimidou e lançou a candidatura do seu filho Wilson Craveiro Holanda. Há de se convir, que o rompimento de Antônio Holanda com Manoel de Castro, muito embora tenha sido encarado como um ato de heroísmo e coragem foi muito mais uma demonstração de desgosto e de insatisfação por ter recusado em apoiar a candidatura do seu filho para prefeito depois de ter-lhe servido fielmente durante tantos anos.

A candidatura de Wilson Holanda tão logo foi levada ao conhecimento público, caiu nas graças do povo. Méritos para isso não lhe faltavam, visto que era jovem, simpático e dinâmico em tudo que fazia. Para reforçar, convidou para vice-prefeito o benquisto industrial de filtros José Mendes.
Na esfera estadual, foi buscar o apoio do Coronel Adauto Bezerra, passando a ser um dos que tomava cafezinho em seu gabinete. Através de dona Judite recebeu também o suporte do Coronel César Cals e do seu filho César Neto, então Deputado Federal.
O nome de Wilson Holanda foi de tal forma aceito pelos limoeirenses que sua ascensão preocupou por demais os partidários do governador que passaram a não acreditar mais em uma vitória fácil.
É bom que se diga, que ambos os candidatos integravam o PDS (Partido Democrático Social) bem como apoiavam Gonzaga Mota ao governo do Estado candidato de Virgílio Távora, Adauto Bezerra e César Cals. A configuração de intriga e desavença que as lideranças estabeleciam no município em estarem sendo apoiado por um ou outro, era apenas um reflexo do que acontecia também no Estado onde os coronéis, mesmo se dizendo “unidos”, brigavam desesperadamente.
Durante a campanha, o crescimento da candidatura de Wilson Holanda tornou-se tão evidente que o governador e seus asseclas, inevitavelmente, tiveram que partir para o uso de várias estratégias caso contrário perderia a eleição, o que não era nada agradável, tendo em vista que essa seria a vitória mais importante na vida de Manoel de Castro, pois na qualidade de governador tinha como ponto de honra ganhar mesmo que tivesse que usar de todo tipo de esquema.
À revelia da própria Lei, começou por efetuar várias contratações em todo o Estado do Ceará.
“No Arquivo Estadual existe uma edição do Diário Oficial, assinado por Castro, em 1982, nomeando mais de 15 mil servidores, sem concurso público, num único dia - antes das eleições. [...] O Estado do Ceará ainda hoje paga o preço de seu governo - que inchou a máquina pública (principalmente de aliados) sem se preocupar como a conta seria paga”. http://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_de_Castro_Filho - Em 31.11.2009)
A respeito de tais nomeações, o jornalista J. Ciro Saraiva (Quixeramobim), dá seu testemunho de que realmente elas foram uma exigência de VT, dizendo o seguinte:

Coube ao Governador Manoel de Castro honrar os compromissos que Virgílio assumira, para que cessassem as resistências à candidatura de Gonzaga Mota, em 1982. Acompanhei-o à casa de VT, onde fomos recebidos reservadamente.
- Virgílio, as nomeações foram feitas. São 16 mil.
Resposta lacônica:
- Muito bem.
O Governador, que não tinha meias palavras, destacou:
- Fiz isso, por causa de você.
Outra resposta lacônica:
- Muito bem.
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Vinte ou trinta dias depois, Virgílio me chama à sua casa:
- Quero dizer ao senhor que jamais concordei com essas nomeações que os jornais estão publicando.
Não pude ficar calado:
- Mas, Coronel, o Governador Manoel de Castro veio aqui lhe dizer que fez as nomeações por causa do senhor!
Cortou-me a palavra:
- Muito pelo contrário, só fizeram me atrapalhar.
Contei ao Dr. Manoel de Castro. Riu gostosamente e depois, comentou:
- O Virgílio é assim mesmo!

Aqui em Limoeiro do Norte, por exemplo, foram efetuadas em torno de duas mil dessas contratações na esperança de que se revertesse em votos favoráveis aos seus candidatos. Os responsáveis pelas indicações das pessoas a serem contratadas, eram os chefes políticos seguidores da doutrina manoelista. O único critério a ser cobrado no ato da contratação, era sobre o voto, que deveria ser dado aos candidatos indicados pelo Governador. Só para ilustrar o episódio das contratações, alguns dos contratados ao ter que apresentar os documentos exigidos e não os tendo o faziam com documentos falsificados, com mais frequência para os certificados de escolaridades. Já o Raio “X” de pulmão, um dos itens exigidos, muitos foram emprestados de um vizinho ou de outra pessoa conhecida.


Ainda sobre as contratações o repórter da TV Verdes Mares Nelson Faheina, por ocasião de uma entrevista com o governador fez a seguinte pergunta:
– É verdade, governador, que o senhor nomeou 15 mil pessoas?
Ele respondeu:
– É mentira. Nomeei trinta mil. São pessoas humildes, e, como elas, vou ainda nomear muito mais. E não me pergunte mais nada. Não admito ninguém me cutucar com vara curta.  (FAHEINA 2011, pág. 154)

O governador, ainda sentindo que estava sendo difícil superar a popularidade de Wilson Holanda carreou para Limoeiro do Norte, algumas obras que julgou importantes e eficientes na conquista dos votos. Aliás as únicas obras trazidas por Manoel de Castro para Limoeiro do Norte, durante suas quase três décadas de atuação como Deputado Estadual.
Foi naquele ano em que se construiu o Terminal Rodoviário, por sinal, um dos mais modernos do interior do Estado. Aproveitando a onda das obras, mandou demolir um prédio que tivera sua construção iniciada na gestão de Custódio Saraiva – Hospital/Maternidade – e edificou o Centro Social Urbano. A demolição foi um presente do governador à família Chaves, visto que o prédio inconcluso era um monumento à corrupção das administrações limoeirenses. Instalou a Sede do DETRAN e por último implantou o PROMOVALE(*) indicando uma considerável melhoria para o trabalhador rural da Região Jaguaribana e, sobretudo de Limoeiro do Norte. Não passou de uma manobra política, pois na realidade nunca esteve a serviço dos objetivos para os quais fora criado.
(*)O Promovale abrangia os municípios de Alto Santo, Aracati, Iracema, Itaiçaba, Jaguaruana, Jaguaribara, Jaguaretama, Jaguaribe, Limoeiro do Norte, Morada Nova, Palhano, Pereiro, Quixeré, Russas, São João do Jaguaribe, Tabuleiro do Norte.
Nem mesmo com isso se fez sentir uma queda na popularidade de Wilson e para Manoel de Castro ser derrotado justamente naquele momento seria uma vergonha por dois motivos: primeiro, porque imbuído do cargo de governador tinha o dever de ganhar para comprovar sua força política e segundo, porque o adversário, no caso Wilson Holanda, foi fruto de um rompimento com seu grupo o que lhe provocou um sentimento de vingança e derrotá-lo seria uma questão moral.
Em meio à campanha, o candidato a vice-governador Coronel Adauto Bezerra compareceu a um comício na Praça da Catedral em apoio a Wilson Holanda, ocasião em que pronunciou um discurso falando sobre o “Careca” fazendo zombaria sobre a forma como o candidato era conhecido. Seu pronunciamento foi ouvido por Manoel de Castro do 1º andar da casa do seu concunhado Genésio Bezerra.
A vinda do Coronel Adauto Bezerra a Limoeiro causou pânico no grupo do governador crescendo o temor de perder aquela eleição. Sem ver alternativa, Castro partiu para o aliciamento direto aos eleitores e, de maneira acintosa e prepotente bem como numa verdadeira demonstração de descompromisso com a Lei usou o dinheiro do contribuinte para derrotar o seu adversário.
Era tão clarividente e aberrante a compra de votos e sem o menor respeito às Leis eleitorais, que em um determinado dia, próximo ao dia da eleição formou-se uma enorme fila, partindo da casa do próprio governador na Rua Padre Joaquim de Menezes, onde foi distribuído dinheiro vivo para o povo na quantia de Cr$ 5.000,00 (cinco mil cruzeiros) para cada pessoa. Sabe-se ainda da distribuição de televisores, máquinas de costura, pneus de bicicletas e outros objetos em troca de votos.
Como última cartada o governador conseguiu trocar o juiz eleitoral quando faltavam apenas três dias para a eleição, voltando a Limoeiro o conhecido Dr. Miguel Aragão, apenas para aquele período.
No dia da eleição mandou para as ruas um enorme contingente policial fortemente armado, para intimidar os eleitores, fazendo reviver o tempo em que os adversários não podiam se manifestar. Os policiais, o juiz e os fiscais da justiça, permitiram que fosse feita propaganda do candidato do governador da seguinte forma: como o número de Gladstone era o 15, todos, até mesmo os que estavam trabalhando nas seções eleitorais, traziam um adesivo de um “jacaré”, relacionando o número 15 do jogo do bicho com o número do candidato.

Naquele fogo cruzado onde se debatiam duas grandes forças políticas, o PMDB para representar resistência e oposição àquelas candidaturas que não passavam de um resultado pelo racha no PDS, resolveu lançar uma chapa em que figuraram os nomes do Dr. Moacir e Cristóvão Pitombeira para prefeito e vice-prefeito respectivamente. Ao realizarem o último comício, os peemedebistas foram ingênuos quando partiram para a mesma data dos seus dois concorrentes e montaram palanque na Praça da Catedral. Além da inferioridade diante do poderio dos outros candidatos, foram ainda massacrados no momento em que realizavam a concentração, quando, tanto a caravana de Wilson Holanda quanto a do Careca, ao fazerem as passeatas, passaram justamente no meio da pequena multidão presente ao evento abafando de vez o coro já quase inaudível dos oposicionistas.

Já os comícios de encerramento dos dois grandes concorrentes foram realizados simultaneamente na Praça da Rodoviária (Careca) e na Rua Cel. Francisco Remígio (Wilson), ambos com a participação de uma grande multidão.
Para finalizar e antevendo ainda a imensa dificuldade em derrotar o adversário, os responsáveis pela campanha montaram um esquema, em que se não pudesse reverter os votos de Wilson em favor de Gladstone, pelo menos fosse conseguido com que o eleitor se abstivesse de votar. Os encarregados desse serviço eram os motoristas, que por ocasião do transporte de eleitores, indagava com quem iam votar, se caso fossem com Wilson, lhe ofereciam dinheiro e o induziam ainda a não votar em nenhum dos dois. Esse último passo foi decisivo para o resultado em favor do Careca, visto que, naquela eleição houve mais de mil e quinhentas abstenções enquanto que a maioria de Gladstone sobre Wilson foi pouco mais de mil e trezentos votos, portanto, menor que o número de abstenções, o que leva a analisar de que sem elas, Wilson teria saído com a vitória.
Sabe-se de uma retirada vultosa em dinheiro do BRADESCO, altas horas da noite em que antecedeu o dia da eleição, para assegurar a compra de votos.
Há quem afirme categoricamente que todo o processo político que levou Wilson Holanda à derrota, teve como mentor o supersecretário de governo o Dr. José Maria Lucena visto como coordenador e conselheiro do governador Manoel de Castro, que por sua vez assinou embaixo todos os atos do seu secretário objetivando resultados positivos naquela eleição. Todavia, a preocupação de Manoel de Castro com Limoeiro do Norte não funcionou em Morada Nova, sua terra natal, onde alguns de seus irmãos e outros membros da própria família eram seus principais adversários.
“O esquema falhou na própria cidade do governador Manoel Castro, Morada Nova, apesar de toda a assistência dada àquele município chegando até a transferir o Banco do Estado do Ceará para lá. Mas o fato é que a família Castro estava dividida. O irmão do governador subia, por exemplo, aos palanques, para pregar a desonestidade e falsidade do mano”. (JUNIOR, 1984, p. 58)
Se ganhou em Limoeiro, em Morada Nova Manoel de Castro perdeu, sendo essa a primeira derrota de um governador em sua terra natal na história do Ceará.
“Ele usou e abusou da máquina estadual para eleger candidatos de sua preferência, mas chegou a perder a eleição em sua cidade natal (Morada Nova), em 1982, tendo a filha como deputada estadual (Douvina Aleuda Eduardo de Castro) e o irmão, Isaias Castro, então prefeito da cidade”.
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_de_Castro_Filho - Em 31.11.2009)
Foi a partir daquele ano que Manoel Castro praticamente encerrou sua vida pública e com isso, fazendo despontar outras lideranças se iniciando um novo ciclo na política limoeirense.

Durante a campanha um trágico acontecimento abalou toda a classe política bem como toda a população do município. Faltando apenas duas semanas para a eleição, foi brutalmente assassinado com um tiro no peito o candidato a vereador Jurahy Santiago, vitima de um crime passional, ao envolver-se com uma mulher. O companheiro desta, enciumado cometeu o fatídico homicídio.
Logo ficou provado que o crime não teve nenhuma relação com a campanha política que estava acontecendo naquele momento, todavia, em acontecimentos desta natureza sempre existem os mal-intencionados que planejam tirar proveito da situação. No caso do assassinato de Jurahy, um desses maldosos políticos, do tipo que não lhe importa o motivo nem o caminho para chegar a um resultado positivo, por mais sórdido que seja esse caminho, chegou a sugerir ao candidato Wilson Holanda a contratação de pistoleiros para assassinar um dos adversários, insinuando ele que a morte de Jurahy teria sido por motivos políticos. Como era de se esperar, Wilson não deu nenhum crédito nem ouvidos ao que sugerira o pernóstico candidato a vereador.

Se na Política “ninguém é santo” há aqueles que vão além da coerência e da ética para se elegerem, pouco lhes importando o conceito de homens públicos. Os fatos interessantes também existem nas campanhas dos candidatos a vereador e que muitas vezes se revestem de fantásticos acontecimentos, frutos de montagens cerebrinas e brilhantemente postos em prática de maneira altamente eficiente. Para comprovar, vamos relembrar o fato que levou o candidato a vereador Gentil Saraiva à derrota na sua campanha para a Câmara Municipal em 1982. Como era afilhado de dona Judite, tinha desta uma especial simpatia, muito embora ela nunca demonstrasse qual era o seu candidato preferido, porem dedicava ao afilhado uma deferente atenção. Essa estreita amizade gerou um ciúme doentio no também candidato Professor Antônio Pergentino Nunes, que tratou de montar uma solerte e sórdida estratégia, a fim de abater a concorrência de Gentil Saraiva, a quem considerava um empecilho na sua intenção de eleger-se vereador. Ora, sabendo ele que existia entre Judite Chaves e Raimundo de Castro algumas mágoas, consequência ainda do rápido pouso deste no ninho de Manoel Castro tão logo terminou a eleição de 1966 – como já vimos – e também sabendo que Raimundo de Castro estava apoiando Zé Holanda Baixim para vereador, resolveu criar uma história, digna de um cérebro astuto e ardiloso. Chamou dona Judite em confidências, dizendo-lhe que Raimundo de Castro andava comentando que ele, Pergentino, não seria eleito, pois dona Judite não tinha mais prestígio como líder política nem votos suficientes para eleger sequer um vereador no município e ia mais além, dizendo que o seu candidato, Zé Holanda seria um dos mais votados o que viria comprovar justamente que ele era quem tinha condições para eleger quem quer que fosse e por isso tinha escolhido para apoiar um nome sem nenhuma expressão política. O poder de persuasão de Pergentino mais uma vez não falhou e, dona Judite, com receio de que se confirmassem os supostos comentários de Raimundo de Castro, desprezou totalmente o nome de Gentil Saraiva e passou a trabalhar com afinco o nome do Professor, resultando em sua espetacular eleição e, por conseguinte, na derrota de Gentil Saraiva, que por muito tempo, guardou a marca da traição do seu correligionário.
Tão grande era a obsessão de Pergentino por uma vaga na Câmara Municipal, que chegou a ameaçar pessoas da própria família, ao tomar conhecimento que parentes muito próximos estavam também se candidatando a uma vaga no legislativo, achando que somente ele tinha o direito de disputar o cargo e a divisão dos votos na família poderia prejudicar a sua candidatura.

Um fato também digno de registro diz respeito à campanha de três candidatos a vereador: José Maria de Andrade, José Holanda (Baixinho) e Rita Peixoto.
Os patrocinadores dos três respectivos candidatos travaram uma disputa dentro do próprio grupo para saber quem elegia o seu vereador com maior quantidade de votos. José Maria de Andrade estava sendo apoiado por José Maria Lucena, José Holanda por Raimundo de Castro e Rita Peixoto por Douvina Castro.
Raimundo de Castro dizia em conversas informais que mostraria àqueles que diziam que ele não tinha mais prestígio para eleger sequer um vereador, e elegeria um nome sem nenhuma expressão política, e por isso escolhera Zé Holanda para dar seu aval político, a quem por deboche o tratava como “Zé Priquitim”.
O fato que os três foram folgadamente eleitos. Quem conseguiu um maior numero de votos, foi Rita Peixoto, tendo sido a campeã atingindo a extraordinária cifra de mais de 1300 sufrágios, numa campanha que se igualou à do prefeito, com direito a trio elétrico exclusivo e sem dúvidas uma significativa soma na eleição do Careca levando-se em conta o grande número de votos obtidos. José Holanda, também saiu bem votado e por fim, Zé Maria de Andrade cuja eleição, segundo ele próprio, lhe deu um mandato ilegítimo.

Para melhor ilustrar a eleição de Zé Maria, é bom que contemos a história verdadeira de como ele chegou ao parlamento municipal. Tudo começou quando o seu sogro Antônio Vicente Maia, achou por bem não concorrer naquele pleito, tendo em vista a sua avançada idade e saúde debilitada. Convidou então Zé Maria para em lugar dele, candidatar-se a vereador que a princípio rejeitou a ideia do seu sogro, porém cedeu depois, indo até Fortaleza para receber o apoio do Dr. José Maria Lucena. Tanta certeza tinha da seriedade que deve ter um homem público, que Antônio Vicente, ao convencer o genro a ingressar no mundo da política, disse que “a política é para os homens de bem”. – pelo menos deveria ser.
A eleição de Zé Maria custou a distribuição aos eleitores de filtros para água, de mais alguns televisores e máquinas de costura. Segundo o próprio Zé Maria, somente os filtros foi do seu conhecimento, e fez a distribuição da forma mais justa possível, sem olhar e nem questionar o voto de qualquer eleitor.
Diante desse pequeno histórico sobre o vereador Zé Maria, nos convém fazer uma ressalva interessante com relação à sua atuação como parlamentar. Era de se esperar que da forma como foi eleito, fosse mais um para não honrar o mandato recebido do povo, todavia ao chegar ao parlamento, Zé Maria transformou-se num ferrenho defensor das causas sociais, marcando presença em todos os movimentos populares, empenhando a sua voz e o seu esforço em prol de causas socialmente justas. Como prova de uma ideologia política realmente identificada com as causas sociais, se filiou tempos depois ao PT (Partido dos Trabalhadores) e é justo dizer, que sua atuação na Câmara sempre foi de respeito aos votos recebidos. Neste caso e para entender melhor a atitude e a conduta política de Zé Maria no seu contexto real, é necessário conhecer o momento histórico e político em que ele teve que se sujeitar à uma maneira imprópria para conseguir o seu primeiro mandato. Achamos conveniente, portanto, atribuímos à esse fato, uma das frases mais famosas de Maquiavel: "Os fins justificam os meios”. Se nesta comparação houve intenção ou não para que tão logo fosse eleito demonstrasse seu caráter de homem verdadeiramente público, a verdade é que Zé Maria deu um exemplo de que a máxima de Maquiavel pode ser colocada perfeitamente em prática, embora saibamos que muitas vezes ela é usada pelos políticos para sugerir que um fim considerado muito importante torne moralmente justificável o uso de um recurso a qualquer meio.

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Sobre a eleição de 1982 não podemos deixar de registrar um fato lamentável com relação ao então prefeito Evaldo Holanda Maia quando se destinou a apoiar o candidato que fora derrotado na eleição passada pelos mesmos que naquele momento de tudo faziam para elegê-lo. Depois de exaltarmos as qualidades de Evaldo e o seu caráter de homem público, somos obrigados a lamentar a sua tomada de posição no que diz respeito àquele pleito eleitoral de 1982 e, nos comprime muito mais em dizer que, apesar do seu caráter inquestionável, se mostrou naquele momento como um homem fraco, quando ajudou a engendrar as manobras para eleger o Careca. É bastante compreensível que ele se sentisse na “obrigação” de proceder dessa forma pelo muito que devia a Manoel de Castro principalmente por torná-lo prefeito em 1976, entretanto, muito mais gratidão devia a Antônio Holanda, que foi quem o indicou de forma incondicional como candidato em 1976. Aqui se encaixam muito bem as palavras do próprio Wilson Holanda quando certa vez se referindo ao fato disse: "Evaldo nos traiu miseravelmente". Portanto, seria mais digno e até para combinar com tudo que dele já dissemos, se não tivesse se mancomunado com aqueles que queriam eleger o Careca a qualquer custo, mas ao que pareceu Evaldo o fez “ex toto corde”.
Sobre o retorno do Careca ao ninho manoelista podemos dizer que foi uma atitude de esperteza, já que pretendia ser prefeito de Limoeiro a qualquer custo e por outro lado, Manoel de Castro ganhou de volta um dos seus mais abnegados serviçais. Com aquela atitude, o Careca, mostrou que o grito de liberdade dado em 1976 não passou de uma farsa e que seu lugar era mesmo o ombro de Manoel de Castro, aliás, de onde nunca deveria ter saído. Sua identidade política teria sido mostrada de forma confiável se tivesse sustentado a sua decisão de chegar ao poder executivo através da força popular e não pela manipulação no aliciamento dos eleitores. Aproveitou-se ainda da morte de Zé Hamilton, visto que se fosse vivo, jamais teria aceitado naqueles termos a sua candidatura. 
Já Wilson Holanda, ao ser derrotado da forma como foi por Manoel de Castro, sentiu na pele aquilo que ajudara a fazer com o próprio Gladstone Bandeira em 1976, quando este foi derrotado por Evaldo Holanda Maia. Ao ser massacrado políticamente por aquele a quem rendeu subserviência, Wilson Holanda veio comprovar de que disputar contra Manoel de Castro era o mesmo que remar contra a maré, ou seja, arcar com a amargura de ser pisoteado e humilhado perante todos. Mesmo tendo sido derrotado de uma forma humilhante, Wilson bem que mereceu ser vítima de Castro e de seus comparsas, visto que até então, lambia e limpava os pés do “Velho Guerreiro” devotando-lhe igualmente a todos, uma subserviência total. E também se sabe que em circunstâncias que lhe fossem favoráveis, com certeza não teria o menor escrúpulo em participar de uma armação nos mesmos moldes daquela que lhe derrotou, para tirar do páreo um adversário.
Manoel de Castro tinha uma característica interessante na sua forma de fazer política. Como já dissemos, não se acanhava em juntar-se com os que em outras ocasiões lhe dirigiram insultos através de palanques adversários. Entretanto, essa estratégia se transformava numa forma de tornar cada vez mais subserviente aquele que regressava para o seu lado, o que importava na realidade, eram os rendimentos políticos e a concretização de seus pretextos eleitorais. Estabelecia entre os seus asseclas um jogo de favoritismo, em que usando de seu prestígio com o governo do Estado presenteava-os com empregos para a família, como forma de convertê-los cada vez mais em seguidores de sua doutrina política. Conseguiu com essa hábil maneira de agir a adesão da maioria das lideranças limoeirenses em troca de empregos e cargos públicos do Estado. Para comprovar, podemos afirmar seguramente que durante o período de sua atuação política em Limoeiro, não vamos encontrar facilmente um servidor público estadual que não tenha sido “empregado” por seu intermédio. Grande parte das famílias limoeirenses, dentre elas, os Holanda, os Castro, os Costa, os Da Silva, os Osterne, etc., tem empregos cedidos por Manoel de Castro e algumas dessas famílias têm, até hoje, empregados praticamente todos os seus membros.

Manoel de Castro usava os palanques políticos com uma perspicácia extraordinariamente peculiar, e seus improvisos no meio dos discursos era o que mais impressionava. Como exemplo, vejamos o que diz o jornalista Ciro Saraiva:
O improviso do dr. Manoel
Em 1982, o Governador Manoel de Castro deu-me uma incumbência:
– Quando eu estiver falando e fizer alguma referência ao Adauto (Bezerra), puxe no meu palitó.
À noite, estávamos em Senador Pompeu, pregando a candidatura de Aécio de Borba. Comício grande, o governador abriu o sarrafo contra Adauto. Fiz o que ele mandara. Ato contínuo emendou no seu discurso:
– E não adianta Ciro Saraiva, puxar meu palitó, não, que ninguém vai me impedir de dizer a verdade!
http://www.casadoceara.org.br/arquivos/Jornal/JornalMaio09/jornal.pdf - em 06.02.2010

Aceitar está do lado de Manoel de Castro, era o mesmo que assinar um termo de que teria que seguir uma doutrina, onde o comandante dificilmente aceitava aposições de suas ideias ou das posições tomadas, criando um fanático proselitismo político onde os seus seguidores passavam a exercer um devotado capachismo, sobretudo em agradecimento aos empregos públicos recebidos. Agindo assim, Manoel de Castro colocou sob o seu jugo praticamente todos aqueles que se destinaram a ser partidários seus, incluindo gente de todas as camadas sociais que ia desde à classe de médicos, dentistas, advogados e agropecuaristas, até aos mais simples e humildes homens do campo. Por outro lado e na hora certa o “velho guerreiro” usava de outra faceta sutilmente habilidosa: era tratar a pão e água alguns dos seus prosélitos, sabendo que eles jamais teriam a coragem e a petulância de deixar de segui-lo. Com relação a essa dúbia e estranha atitude, dizia às vezes, que “não teria nenhuma vantagem em investir naquilo que já era seu”. 
O exemplo que podemos citar para confirmar esse gesto é o de Francisco Moreira Filho de Tabuleiro do Norte, que segundo o seu filho Jesus Moreira de Andrade, Chico Moreira era seguidor extremamente fiel à doutrina política de Manoel de Castro, mas que sofreu durante toda a sua vida o desprezo e a indiferença por parte do chefe, principalmente com relação aos empregos, com os quais costumava presentear os seus seguidores. Ainda segundo Jesus Moreira de Andrade, mesmo depois da morte do pai, Manoel de Castro não se sensibilizou:
”...ficamos em quase completo abandono por parte do Deputado Manoel de Castro Filho, a quem meu pai foi “fiel até a morte””. (ANDRADE J. M., 1980, p. 82)
Jesus diz ainda que sua mãe viúva tentou por várias vezes uma ajuda para a família, que passava por imensas dificuldades financeiras. Mesmo dizendo-se abandonado, Jesus Moreira lembra que tiveram os empregos sim, porém à custa de muito esforço de sua mãe que passou a implorar humildemente de Castro:
“Lembramos que naquela época quase todos os dias a nossa mãe se deslocava do bairro Otávio Bonfim, onde morávamos numa casa alugada, até o bairro de Fátima, a pé, onde morava o deputado Manoel de Castro. Apesar de todo esse sacrifício e humildade da nossa mãe viúva, nada foi conseguido, a não ser o emprego de contínuo nas repartições do governo, cargo este que assumimos com a maior naturalidade, forçados pelas dificuldades que estávamos passando.” (ANDRADE J. M., 1980, p. 82)
A CANDIDATURA DE GONZAGA MOTA – O ACORDO DOS CORONEIS


Também acontecia naquela época a primeira eleição direta para governador após a Revolução de Março de 1964. A novidade era que para participar das eleições, os partidos eram obrigados a apresentar candidatos a todos os cargos em disputa e o eleitor não podia votar em candidatos de partidos diferentes, ou seja, era obrigado a votar no mesmo partido para todos os cargos, caso contrário o voto seria anulado. Foi o que ficou conhecido como "voto vinculado” cujo objetivo era de que ao se juntar as eleições para todos os cargos em um único pleito, o PDS saísse favorecido e fortalecido, já que se encontrava visivelmente desgastado pelas práticas politiqueiras estabelecidas desde a antiga ARENA. Esse foi o único motivo pelo qual o “voto vinculado” foi legalmente adotado em 1982, muito embora, a alegação fosse de que os partidos sairiam fortalecidos e teria assegurada a fidelidade partidária. Mas na prática mesmo, o que se julgava era que a vinculação do voto beneficiasse o PDS, partido do Governo Federal, dominante na maioria dos estados e dos municípios no país. O certo é que a estratégia não funcionou como o desejado e incrivelmente, o PMDB teve suas bancadas aumentadas de forma considerável em praticamente todos os Estados da federação e ainda mais com a surpresa causada pela grande quantidade de votos brancos e nulos, numa clara demonstração de insatisfação do eleitor brasileiro.
No Ceará, para que se definisse quem seria o candidato de consenso dos coronéis necessitou de um acordo na presença do então Presidente da República General João Figueiredo, consolidando o famoso Acordo de Brasília ou mais vergonhosamente o Acordo dos Coronéis.
Tudo começou quando Adauto Bezerra dizia em entrevistas que seria candidato e Virgílio Távora também divulgava pela imprensa através do Governador Manoel de Castro que Aécio de Borba sairia candidato com o seu apoio. Naquele momento o racha no PDS cearense era evidente. Sentindo que estava perdendo espaço para os dois desafetos, César Cals usou do seu prestígio junto ao Presidente Figueiredo para que os três fossem convocados a uma reunião no Planalto e mediante a um acordo estabelecessem as regras para as eleições daquele ano no Ceará.
Em meio à reunião Virgílio Távora surpreendeu a todos quando arrancou do bolso do paletó um nome do seu antigo secretariado para candidato. Tratava-se de Luiz Gonzaga da Fonseca Mota, um jovem economista, Professor da UFC, Técnico do BNB e até pouco tempo Secretário de Planejamento do governo, o qual VT considerava altamente competente e além do mais alegava ser um nome neutro e longe dos interesses grupistas. Aquela atitude de Virgílio resultou numa frase amplamente divulgada de que fora “tirado um totó de um saco de gatos”, numa alusão de que em meio a todo aquele emaranhado de interesses pessoais VT, conseguiu sobrepor a sua vontade indicando um nome aparentemente manobrável e mais uma vez levou vantagens graças às suas inteligentes manobras. Se a expressão totó – na frase – fazia referência a um cão pequeno, a palavra também significa Chute Fraco o que ironicamente se enquadrou tempos depois na situação dos coronéis, já que Gonzaga Mota rompeu com todos eles durante o seu governo.
Ainda fazendo parte do “acordo” Virgílio partiria para o Senado, Adauto entraria na chapa como vice-governador e Cals indicaria o prefeito de Fortaleza - indicou o seu Filho César Cals Neto (1983/1985) - enquanto o Estado seria dividido em três fatias de 33% dos seus cargos para cada um deles, sobrando – matematicamente – 1% para o novo governador.
Se não tivesse havido o acordo e as intenções dos coronéis em disputar o poder “cada um por si” tivesse se concretizado o Ceará teria tido uma campanha de um só partido, porém com dois fortíssimos blocos: um apoiado pelo poder da máquina administrativa do Estado, portanto, patrocinado pelo dinheiro do povo através do Governador Manoel de Castro e o outro apoiado pelo poder econômico/empresarial dos Bezerras do Cariri. Mas falou mais alto o interesse pessoal de cada um, razão pela qual acharam melhor lotear o Estado entre eles e seus apaniguados.
Contudo, ao se iniciar a campanha eram claras as divergências entre os coronéis. Adauto Bezerra, mesmo sendo candidato a vice-governador, demonstrava não ter o menor interesse em que Gonzaga Mota se elegesse, justamente por ter sido indicado por Virgílio Távora, antevendo que Mota seria uma peça de fácil manobra política nas mãos de VT. Diante disso, orientou aos seus partidários a encabeçar uma campanha em favor do “Voto Camarão”, sugerindo que em virtude da vinculação do voto, onde o eleitor tinha que votar em candidatos de um mesmo partido, não teria o voto anulado se deixasse de votar em algum nome da chapa, portanto, não haveria problema em desprezar o voto de governador que encabeçava a lista e marcar os outros postulantes, ou seja, de senador a vereador.
Esse procedimento poderia desencadear numa enormidade de votos brancos para governador e reverter o resultado em favor de Mauro Benevides, candidato do PMDB.
Era com essa briga interna que Mauro Benevides esperava ser beneficiado, repetindo a dose da eleição de 1974, quando foi eleito senador ainda no MDB. É que naquela eleição o candidato a senador arenista Edílson Távora – indicado por César Cals – mantinha uma área de fortes atritos na política cearense, além de ser inimigo pessoal de Virgílio, que evidentemente não o apoiou, resultando numa vitória espetacular de Benevides para o Senado Federal.
Só que em 1982 mesmo sugerindo o “voto camarão”, no final prevaleceu em Adauto Bezerra o instinto econômico/empresarial, temendo uma perseguição do planalto sobre suas empresas e resolveu colaborar para que Gonzaga Mota fosse eleito.
Aquela seria a última eleição sob o comando do Coronéis, e como se fosse uma premonição de Virgilio Távora, podemos destacar o seguinte:


A profecia de vt
15 dias antes das eleições de 1982, Virgílio Távora reuniu a Assembléia de Comunicação e o Coordenador de Campanha, Aldenor Nunes Freire. Mostrou números que lhe eram trazidos pelo SEI (Serviço Estadual de Informações) que asseguravam a vitória de Gonzaga Mota (PDS) sobre Mauro Benevides (PMDB). Depois, perguntou:
- Qual vai ser a maioria do Totó (Gonzaga)?
- 200 mil votos, chutei.
- 300 mil votos, sugeriu Aldenor.
Virgílio emitiu sua opinião:
- Ganharemos por mais de 600 mil votos.
Votação apurada para Governador: Gonzaga Mota: 1.140.259
(58,7% do eleitorado); Mauro Benevides, 478.755 (24.5) maioria:
661.794 votos. Ao encerrar a reunião, depois de recolher os calhamaços de  informações, Virgilio fez uma frase profética:
- Esta é a última vitória dos coronéis.
Em 1986, deu Tasso Jereissati pelas mãos de Gonzaga.
J. Ciro Saraiva (Quixeramobim), jornalista
http://www.casadoceara.org.br/arquivos/Jornal/JornalAbril09/jornal.pdf em 18/11/2011
GONZAGA MOTA - GOVERNADOR

Ao chegar ao cargo maior do executivo estadual em 1983, Gonzaga Mota, o Totó, teve que assumir obedecendo aos critérios políticos, estabelecidos por força do Acordo de Brasília, que o obrigou a dividir os cargos do Governo em partes iguais e da seguinte forma: Virgílio Távora ficou com a Secretaria de Educação, de Administração e Interior; Adauto Bezerra, com a secretaria de Saúde, a de Agricultura e a dos Assuntos Municipais; César Cals ficou com a Casa Civil e a Procuradoria Geral do Estado.
Evidentemente que isso dificilmente poderia dar certo, até porque Mota também não era tão tolo de aceitar cargo de governador tão somente para assinar papéis. De início, ao nomear os secretários e assessores, colocou em posições estratégicas pessoas confiáveis, muitos deles disfarçados de coronelistas.
”...o Governador coloca vários “olheiros” de sua inteira confiança em posições chaves da administração. (JUNIOR, 1984, p. 71)
Não demorou muito para começar a rolar cabeças importantes dentro do governo, irritando principalmente partidários virgilistas queixando-se de que o governador havia traído o chefe.
Depois de várias demissões, o que intensificou a crise dentro do PDS que já vinha sensivelmente abalado e motivado pela própria política que vinha se desdobrando no país, Gonzaga Mota rompeu de vez com os coronéis e partiu com a intenção de fazer com que sua estrela brilhasse nacionalmente quando aderiu ao movimento que tratava das eleições presidenciais, unindo-se ao vice-presidente da república Aureliano Chaves e aos senadores Marco Maciel e José Sarney, com os quais fundou a Frente Liberal. Com essa atitude, demonstrava a sua independência política, sendo ele o primeiro governador do país a se definir contra o governo central. Isso fez com que o presidente Figueiredo lhe escrevesse um bilhete do próprio punho o chamando de pseudoamigo, em virtude de antes, Mota ter se manifestado a favor de Mário Andreaza, candidato do PDS à presidência da república.
Começou dessa forma o surgimento de uma nova facção política comandada pelo governador do Estado e, afora os que foram convidados também passaram a fazer parte do novo seguimento engrossando a fileira gonzaguista, aqueles que sempre estão dentro de todos os governos, não importa quem seja o chefe.
Com a liberdade anunciada e a declaração pública do governador dando conta do rompimento político com os que o apadrinharam, teve início a queda do poder político dos coronéis chegando ao fim o ciclo mais tirânico da história política cearense e Gonzaga Mota foi o último governante a transferir para o governo todos os compromissos impostos por patrocinadores de campanhas eleitorais.

Capítulo XV - MANOEL DE CASTRO – GOVERNADOR DO ESTADO

O PERIODO DA ADMINISTRAÇÃO de Evaldo Holanda foi marcado principalmente pelos acontecimentos políticos em torno do nome de Manoel de Castro que naquela época, mais do que nunca, ditava as regras do jogo e a maioria das personalidades limoeirenses seguia as diretrizes por ele norteadas.
Para exemplificar de que as condições de Manoel de Castro impostas aos limoeirenses eram obedecidas, por três eleições consecutivas (1970, 1974 e 1978) trouxe o fortalezense e desconhecido dos jaguaribanos o Dr. Marcelo Caracas Linhares, para ser votado Deputado Federal numa verdadeira demonstração de que suas vontades eram sempre aceitas. Como não podia ser diferente, Marcelo Linhares não deixou uma única marca de sua passagem por Limoeiro do Norte, vinha somente em época de eleições, recolhia os votos e distanciava-se por quatro anos, sem ter sequer a hombridade de, pelos menos, agradecer os sufrágios recebidos dos limoeirenses.
Em 1978 aconteceu um fato na vida pública de Manoel de Castro que lhe serviu como uma “coroa de louros” ofertada por seu chefe político Virgílio Távora como reconhecimento pela sua exagerada fidelidade. É que ao ser indicado pelo então Presidente da República General Ernesto Geisel como o nome de sua preferência para concorrer no pleito indireto para Governador do Estado, Virgílio não titubeou em convidar o seu discípulo mais fiel para Vice-Governador, ou seja, Manoel de Castro ignorando inclusive alguns acordos políticos.

O deputado Manoel de Castro, mediante a um convite daquela natureza, não hesitou em aceitá-lo, e somente assim, deixaria a Assembléia Legislativa depois de ter sido eleito por sete vezes consecutivas: 1951, 1955, 1959, 1963, 1967, 1971 e 1975. Nesse caso, tinha que indicar um nome que pudesse dar continuidade ao seu trabalho político na Assembléia, não somente em Limoeiro do Norte, mas em Morada Nova e o restante da Região Jaguaribana. É possível que alguns dos seus asseclas, tenha sonhado com uma indicação para sair candidato a deputado estadual, mas o que aconteceu, foi mais uma vez uma imposição de Manoel quando apresentou sua filha Douvina Castro na qualidade de herdeira política. O único mérito de Douvina era o de ser sua filha, porém totalmente desconhecida dos limoeirenses e até então sem nenhuma experiência na política. Mas o “velho guerreiro” tinha cacife de sobra para eleger quem quer que fosse.
Douvina foi eleita com facilidade, numa prova de que Manoel de Castro detinha ainda uma força enorme junto ao eleitorado jaguaribano. 

Douvina foi eleita em 1978 com a expressiva votação de 30.836 sufrágios. Para a legislatura de 1983/86, foi reeleita, conquistando um número ainda maior de votos: 36.299.

Em julho de 1980, um trágico acontecimento abalou enormemente o desempenho político de Manoel de Castro na região jaguaribana. Foi o falecimento do seu mais confiável estrategista político José Hamilton de Oliveira (08.07.1980), em decorrência de um acidente de trânsito na BR-116 próximo a Russas, quando viajava para Limoeiro do Norte, juntamente com a deputada Douvina Castro, sendo que esta escapou por um milagre, para que a tragédia não fosse maior. Esse fato desagradável estremeceu as bases políticas do “velho guerreiro”, encontrando mais tarde imensas dificuldades de substituir aquele que se caracterizou como o mais esperto de todos os que faziam política de bastidores.

Foi a partir da morte de José Hamilton que se afinou a amizade entre Manoel de Castro e Dr. José Maria Lucena, naquela época visto como uma das inteligências exponenciais de Limoeiro e mesmo tendo começado sua participação na política pelo MDB em 1966, brevemente engajou-se na ARENA pousando confortavelmente no ninho manoelista.

Em 15 de março de 1982, Manoel de Castro assumiu o governo do Estado fechando com chave de ouro a sua vida pública, quando Virgílio teve que se afastar para concorrer a uma vaga no senado. Nomeou para a Chefia da Casa Civil e Secretaria de Administração exatamente o Dr. José Maria Lucena recompensando-o pela sua fidelidade.
Mesmo tendo ficado cerca de 9 meses no cargo, deixou a casa própria que tinha e mudou-se com a família para a Residência Oficial do Governo do Ceará (próxima ao Palácio da Abolição, na época sede do governo). Também usou o Ford Landau preto 1982, com placa de bronze "G1", com ajudante-de-ordem fardado sentado no banco dianteiro e grande escolta, em todas as suas movimentações por Fortaleza e Interior. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_de_Castro_Filho- Em 31.11.2009)
Mesmo sendo governador, Castro não deixou de seguir as orientações do seu chefe Virgílio Távora, que o instruiu na confecção de um esquema visando a retomada das prefeituras cearenses que naquele momento a grande maioria delas se encontrava nas mãos de César Cals e de Adauto Bezerra.
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Quando por ocasião da mudança na Lei extinguindo o bipartidarismo em 1980 e permitindo a criação de novos partidos, os três coronéis cearenses embarcaram na mesma sigla PDS (Partido Democrático Social) sucedâneo da ARENA. O objetivo desse comportamento era ficarem se revezando como bem afirma com perfeição o cientista político Josênio Parente: "Nessa época, eles pertenciam ao mesmo partido, mas viviam uma disputa de poder”. Todavia, dependendo da necessidade e das circunstâncias do momento, brigavam e se uniam convenientemente.
Mesmo com as divergências existentes entre eles, a ida de todos para um mesmo partido dava uma demonstração clara de que as brigas pelos interesses pessoais continuavam, mas nenhum deles se arriscava fazer oposição ao governo federal. O sistema político por eles criado passou cada vez mais a ser alimentado pela intriga, pela desconfiança e pela fofoca, configurando um verdadeiro serviço de puxa-saquismo entre os seus respectivos sectários e apaniguados que faziam o mesmo jogo no interior do Estado em que os chefetes políticos interioranos pouco se importavam de estarem hoje com um e amanhã com outro.
Enquanto isso, o povo continuava pagando caríssimo por um tenebroso festival de interesses pessoais e a cada dia, a cada eleição, a cada troca de coronel no poder, o estado de pobreza e de subserviência se agravava continuadamente, fazendo do cearense um mendigo, cuja miséria abastecia cada vez mais a sanha dos poderosos.
Mas, era preferível para cada um deles, que o povo continuasse miserável, por que sabiam que o homem de estômago vazio não resiste ao aliciamento, tornando-se uma presa de fácil manobra política e devido ao estado de miséria troca o seu voto por qualquer esmola, basta que pelo menos por um dia, torne farta a barriga dos filhos.
Por mais que se encontre alguma obra proveniente dos três coronéis cearenses na época em que estiveram no poder, nada superará ao efeito de miséria que provocou no povo cearense, sobretudo no interior do Estado. Na verdade, a grande obra foi a implantação da indigência, da corrupção eleitoral, do aliciamento na hora voto, da conquista do poder a qualquer custo e, tudo isso é incomparavelmente cruel, a ponto de encobrir qualquer outra atitude que possa ser descrita como razão de desenvolvimento.

A VOLTA DE VIRGILIO AO GOVERNO DO ESTADO EM 1978

A indicação de VT para o governo estadual pegou de surpresa a maioria da classe política cearense que considerava praticamente impossível a possibilidade de Távora receber indicação de um dos governos militares, sobretudo porque havia a versão de um famoso telegrama, solidário às medidas de João Goulart às portas da revolução, além de ter sido ministro da Viação e Obras Públicas do seu governo. Apesar do ”bendito” telegrama ter sido muito propalado e comentado nos meios políticos e até na imprensa, Geisel o ignorou totalmente e indicou VT para governador. O que parecia impossível foi relativamente fácil e somente um homem muito esperto como Virgílio, é que poderia conseguir a façanha de haver apoiado João Goulart e depois ser indicado por um militar para governo do Estado.
Quem não gostou da indicação de VT, foi o ex-governador César Cals, que se julgava merecedor de ser novamente indicado, uma vez que gozava de farto prestígio no governo central. Em não sendo o escolhido por Geisel e como fazia oposição cerrada a Virgilio, resolveu candidatar-se e com ele concorrer naquele pleito indireto no que foi fragorosamente derrotado, numa prova de que uma indicação do Planalto significava vitória certa, contando ainda com a ação de uma classe política de maioria fisiológica onde os deputados – com as exceções de praxe – não se atreviam votar em um nome que fosse contrário àquele indicado pelo Presidente da República.
A volta de Virgilio ao governo do Estado revelou mais uma vez sua esperteza em levar vantagem na política. Ao se tornar chefe do executivo estadual, não hesitou em mais uma vez impor o seu poder de fogo, estabelecendo todas as estratégias possíveis para inviabilizar politicamente os seus dois desafetos: César Cals e Adauto Bezerra. O enfrentamento com os dois outros coronéis da política cearense seria o seu maior obstáculo, porém, imaginou inteligentemente uma forma de neutralizar essas duas forças, lançando um plano de governo que se tornasse um marco forte na administração. Daí ressurgiu o famoso e propalado PLAMEG,[1] ou seja, Planos e Metas Governamentais nº 2.
As ações de Virgilio Távora para inviabilizar os dois grandes adversários César e Adauto, denotavam a grande preocupação com a aceitação que os dois gozavam no interior do Estado. O Primeiro, César Cals, tornou-se um dos fortes coronéis da política cearense e detinha uma boa parte dos prefeitos interioranos sob o seu comando e o segundo, Adauto Bezerra, era o motivo da maior preocupação de VT, pois quando foi governador, conseguiu eleger 95% dos prefeitos, numa verdadeira demonstração de força política.
Pretendendo eliminá-los em curto prazo, Virgílio montou um esquema político-administrativo jamais visto na história cearense ao dar bastante ênfase para a indústria através do PLAMEG II, conseguindo instalar o II Pólo Industrial do Nordeste no Ceará, sendo essa uma eficiente maneira de atrair apoio político de empresários cearenses com a certeza de que lhe agradeceriam imensamente, uma vez que colocaria o dinheiro do Estado à disposição deles.
Através da esposa D. Luiz Távora, implementou a criação de vários projetos sociais principalmente em Fortaleza e devido a sua forte atuação, recebeu inclusive o apelido de "Deusa da Pobreza":
Figura inteligente e com uma capacidade de trabalho contagiante, desenvolveu na periferia de Fortaleza, junto às favelas principalmente, trabalho de assistência social, que terminou transformando-se numa verdadeira fábrica de votos”. (JUNIOR, Wilson Roriz. Sim Senhor Coronel. 1984. P. 57)

Voltou-se com esperteza e sagacidade para o atendimento aos correligionários e ainda premiando políticos interioranos adeptos dos seus opositores para aumentar sua força política.
Não se preocupou em endividar o Estado até o limite com a folha de pagamento gerando um descontrole financeiro que resultou numa frase célebre e dita por ele de forma bastante irônica, transcrita para os anais da história do Ceará: “Dívida de Estado não se paga, se rola”. 
Na batalha em que tentava derrubar os seus maiores adversários, contou com inconteste dedicação do seu mais abnegado discípulo Manoel de Castro que na qualidade de vice-governador, ajudava-o na montagem da estratégia dando-lhe a necessária tranqüilidade para imaginar que a região jaguaribana estava salva da sanha eleitoreira de César Cals e Adauto Bezerra.
E foi a Manoel de Castro que VT entregou o governo do Estado, quando teve que afastar-se para concorrer a uma vaga no senado o instruindo nas estratégias para a campanha para governador e senador. 
Assim, através do Governador Castro, criou o PROMOVALE anunciando a implantação de um ambicioso e audacioso projeto de irrigação para o Vale do Jaguaribe, que nunca funcionou.
Também orientou e endossou as aproximadamente dezesseis mil nomeações sem concurso público para diversos cargos do Estado, nomeações essas feitas à revelia da Lei pelo seu sucessor.

[1] Plano de Metas do Governo (Plameg), lançado por Virgílio no início de seu primeiro governo (1963-1966). O Plameg continha metas de ações para o Estado durante os quatro anos de sua administração