sexta-feira, 4 de setembro de 2020

CAPITULO XX - 1990 – DISPUTA PARA A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA E CÂMARA FEDERAL

PODEMOS CONSIDERAR que pelo menos até as eleições de 1990 existia apenas um grupo político em Limoeiro fecundado na mente do seu mentor principal Gladstone Bandeira a partir de 1982 e nem mesmo nas oito décadas de domínio dos Chaves até 1954 foram tão explícitos os malabarismos pela ganância do poder. Até aquele instante nenhum sistema político havia escrito com tanta competência uma história de desmandos administrativos.
Com o advento das eleições de 1990 (governador, deputados estadual e federal e senador) se configurou o racha do grupo que se dividiu em duas facções de peso. Nos extremos, Dilmar e Careca: protagonistas de uma cena política assistida pelos limoeirenses em que ambos aproveitavam o momento para medir suas forças junto ao eleitorado.
Para que se desencadeasse realmente numa disputa política foi preciso aparecer candidatos a altura de uma briga que já se tornara um divisor entre o eleitorado.
Foi assim que sobreveio para o cenário político limoeirense o Delegado da Polícia Federal Paulo Carlos da Silva Duarte como postulante a uma vaga na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará. Filiado ao PDC (Partido Democrata Cristão) e apoiado pela coligação PDT/PDC/PSDB. Recebeu o apoio do prefeito João Dilmar que se colocou à disposição de sua campanha. – Aliás, essa passaria a ser a marca mais forte de Paulo Duarte: aproveitar-se da prefeitura na angariação de votos.
Paulão, como era conhecido na juventude pelas ruas da cidade, passou a ser mostrado nos palanques como uma salutar novidade para Limoeiro onde se propagava a sua condição de Delegado da Polícia Federal e que voltava à sua terra imbuído do propósito de tornar-se seu legítimo representante. Numa visão estreita de bairrista vinda dos patrocinadores de sua candidatura, havia uma conclamação aos eleitores para votar em Paulão e de que o eleitor tinha a obrigação de elegê-lo pelo fato de ser um limoeirense, criando-se inclusive a ideia de que quem não votasse nele seria considerado um anti-Limoeiro.

Para confrontar com as forças ditas “inovadoras” do prefeito e do seu candidato, o Careca, numa tentativa de sobrevivência política, resolveu lançar tambem um candidato e apelou para o seu primo Pedro Julião na disputa por uma vaga na Assembleia Legislativa. Como estratégia, levou para o palanque em forma de propaganda eleitoral, os ressentimentos de ter sido desprezado pela administração bem como o arrependimento de ter ajudado a eleger prefeito um homem que mijou para trás[1], esperando com isso o reconhecimento dos eleitores.
Pedro Julião por sua vez sentindo-se discriminado pelo prefeito acirrava as hostilidades entre este e o Careca e a sua candidatura serviria como um termômetro na medição dos prestígios e das popularidades dos figurões de ambos os lados.
Nesses termos, aquelas duas candidaturas deram para eleição de 1990, as características de uma disputa que se igualou a uma campanha para prefeito, visto que se confrontavam nos palanques as duas maiores figuras da política local, numa verdadeira demonstração de ambições pessoais, subestimando a capacidade do eleitorado e fazendo da seriedade de uma eleição uma brincadeirinha onde cada um queria tirar vantagens e mostrar quem era o mais forte.
O mais interessante era saber que há menos de dois anos estavam todos eles no mesmo palanque em recíprocos elogios, para naquele momento se mostrarem participantes de um jogo de enganação voltando ao cenário de uma campanha para se digladiarem num total desrespeito ao eleitor.
O que se assistiu na verdade foi um espetáculo digno de cinema: de um lado o prefeito Dilmar querendo passar para a população de que Paulo Duarte representava naquele momento a modernidade e o desenvolvimento, ou seja: era o nascer e a confirmação de uma nova fase para Limoeiro. Do outro, o Careca, proclamando-se traído e tentando com isso receber apoio do eleitorado para revidar a traição sofrida pelo grupo de Dilmar a quem agora dizia que o mesmo “tinha cara de boneca” e apresentando como solução o nome do seu primo Pedro Julião, atribuindo a ele, tambem um passo largo para a modernidade e o desenvolvimento do município. Certo de que Julião seria bem votado o Careca levou em conta o grande número de seguidores que lhe devotava fidelidade.
Depois de tanto se aviltarem e se engalfinharem, o resultado final deu a vitória a Paulo Duarte enquanto Pedro Julião garantiu a suplência. Neste primeiro embate saiu bem mais fortificada a liderança de Dilmar, confirmando o seu “carisma” junto ao povo, o que o levou a imaginar haver superado a popularidade de todos os outros políticos, inclusive o anacrônico Careca.
A junção de Dilmar e Paulo Duarte poderia se dizer ter sido um casamento perfeito se tempos depois não tivessem ambos se revelado serem exatamente iguais no que diz respeito à ausência de proposta inovadoras, fazendo regredir o já tão abalado processo político limoeirense.
Ao agirem de maneira a não valorizar os votos recebidos e apelando para a enganação e conversa fiada, a dupla (Paulão & Dilmar) certamente sabia – assim como todos os maus políticos sabem – que ao invés de avaliar propostas de candidatos em campanhas bem como analisar atitudes de candidatos e até dos políticos em geral, o povo na sua indiferença e alienação, prefere muitas vezes partir para opiniões particulares e em casos mais extremos até para as aparências físicas.
Paulo Duarte depois de eleito abandonou o seu partido inicial e filiou-se ao PSDB, já pretendendo usar sempre dos favores dos governos estadual e municipal nas eleições que adviriam.
Como sua primeira demonstração de que iria realmente se transformar no político mais truculento da história de Limoeiro do Norte, voltou à praça pública e quando se esperava um discurso de agradecimentos aos que o elegeram, simplesmente fez um pronunciamento inflamado e dentro de um linguajar literalmente policialesco, atentando contra aqueles que não votaram nele, sobretudo os políticos que estiveram do lado contrário à sua candidatura. Com a aparência de que havia ingerido algumas doses de uísque e fazendo um relato da dura campanha, escarneceu nas suas palavras, principalmente a ex-candidata a prefeita Rita Peixoto por ter apresentado aos eleitores para ser votado em Limoeiro um candidato de fora, (Rita Peixoto, naquele ano, apoiou a candidatura de Antônio Tavares, natural do município de Barros) o que considerava inadmissível, especialmente porque existiam dois postulantes limoeirenses.
No capítulo cômico do seu discurso, chegou a se condoer da situação do seu pai o comparando a um “sebito” fazendo uma analogia entre o pássaro e o físico magro do genitor que estava naquele estado depois de tanto haver trabalhado em favor de sua eleição.
Ao assumir, transformou-se num oportunista de carteirinha, ou seja, se dispôs à cata entre os órgãos do governo se haveria algum benefício para Limoeiro e ao descobrir a sua existência, assumia imediatamente a paternidade do benefício, dizendo para população ser um esforço unicamente seu.
Era tão evidente essa sua faceta demagógica e enganadora que os seus feitos no município nunca passaram de rede de energia elétrica para pequenas comunidades e micro abastecimentos de água através de projetos do governo sem falar em asfaltos nas estradas estaduais; tudo como sendo obra sua.
Em algumas rodas de conversas, quando se fazia referências aos benefícios que Paulo Duarte trouxera para Limoeiro do Norte, alguns mais exaltados chegavam a desafiar o Deputado para mostrar uma única obra que tivesse sido comprovadamente construída com seu esforço.
Desde então Paulão passou a demonstrar a verdadeira característica de sua personalidade política: quando falava era um Paulo Duarte democrático, conciliador, negociador, enfim, imbuído de todas as qualidades de um líder, porém fora do público, não passava de um ditador em suas posições políticas.

Aquela eleição trouxe outra novidade, inicialmente encarada como uma surpresa agradável e benéfica para Limoeiro do Norte. É que postulando uma vaga para a Câmara Federal, apareceu o Engenheiro Francisco Ariosto Holanda se apresentando com um perfil de um candidato sério e sem o desenho do riso fácil, que impressionou rapidamente os limoeirenses. Muito embora sendo desconhecido de grande parte da população, mesmo tendo sido Secretário da Indústria e Comércio do Estado do Ceará, (1987-1989), foi identificado muito mais por pertencer a uma das mais tradicionais famílias limoeirenses, sendo filho de Chiquinho Holanda, irmão de Antônio Holanda, o “Velho da Serra”.
Iniciou sua carreira política com uma filiação de esquerda, ingressando no PSB (Partido Socialista Brasileiro) e para combinar com essa atitude, naquela eleição fez parte da coligação entre PT/PCB/ PSB/PC do B.
Em seus pronunciamentos esboçava uma ideologia contrária ao conservadorismo existente no sistema político brasileiro, posicionando-se tenazmente como um defensor incondicional de medidas inovadoras na solução para os problemas sociais. Assegurava firmemente que grande parte do problema crônico da miséria brasileira seria solucionada através do que ele chamou de “tecnologia de fundo de quintal”, presumindo que cada um, dependendo da vontade e do apoio do poder público, poderia fazer o seu próprio negócio sem que necessariamente tivesse que virar um empresário.
Com a compreensão de uma considerável parcela dos limoeirenses bem como com a ajuda das “lideranças” políticas locais, Ariosto foi eleito para o seu primeiro mandato (1991-1994). Sua primeira atuação na Câmara Federal foi obscura e sem qualquer ato que merecesse destaque, nem mesmo alguma atitude na defesa de suas ideias socialistas tão divulgadas no decorrer da campanha.
Mais adiante, vamos ver que Ariosto Holanda não se preocupou em honrar os sufrágios recebidos dos limoeirenses no que diz respeito à sua atuação como político, o que causou uma decepção naqueles que acreditaram em sua performance de homem determinado em lutar pelas classes menos favorecidas.

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Aqui já nos cabe dizer que nos surpreende a facilidade com que os homens que se dizem públicos manipulam as consciências das pessoas humildes e na busca do poder se imbuem de falsos propósitos que são propagados como solução para os diversos e graves problemas da população.
Para esconder suas falsidades não deixam de serem extremamente cautos em suas mensagens a fim de conseguirem o objetivo que tanto almejam. Estarrece-nos a maneira como conseguem tanta frieza para burilar palavras que não passam de uma profunda e muito bem maquinada demagogia para conseguir o voto, depois vão para seus gabinetes e excluem dos seus discursos aqueles que lhe deram um status de nobreza.
Os acordos costurados e os conchavos feitos à revelia do povo criam entre eles possibilidades de dividir o que é público para usar a bem de si próprios. Nesses conchavos e acordos chegam inclusive ao descaramento de estabelecerem parâmetros de como ficam os cargos, onde cada um dos interessados e com poder de barganha, abocanha a sua fatia no bolo.
Invariavelmente a desonestidade em enganar consciências leva a outro ato desonesto muito mais grotesco e repugnante que é o desvio do dinheiro público. Os que descambam para esse caminho nos faz estarrecidos pelo dom que tem de facilmente conseguir drenar os recursos de um povo para suas contas particulares sem a menor preocupação em esconder dos olhos de suas vítimas. Como se sentem em suas consciências esses homens? Será que não lhes causa remorso por haverem burlado a fé alheia? O pior é que nos parece óbvio inexistir neles o toque da consciência.

[1] Faltou com a palavra dada.

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