segunda-feira, 28 de abril de 2025

Capítulo XXIII - A ELEIÇÃO DE 1996

Ainda que alguém me diga
Que viu um mudo falando
Um elefante dançando
No lombo de uma formiga
Não me causará intriga.
Escutarei com respeito
Não mentiu esse sujeito.
Muito mais barbaridade
É haver numa cidade
Prefeitura sem prefeito.

Não vou teimar com quem diz
Que viu ferro dá azeite
Um avestruz dando leite
E pedra criar raiz
Ema apanhar de perdiz
E um rio fora do leito.
Um aleijão sem defeito
E um morto declarar guerra
Porque eu vejo em minha terra
Prefeitura sem prefeito.
Patativa do Assaré
Extraído do poema “Prefeitura sem Prefeito”

NO INÍCIO DE 1996, Limoeiro do Norte passava pelo pior período da história de suas administrações até então. O prefeito Ademar Celedônio onde quer que fosse visto estava sempre embriagado. A prefeitura completamente sem prefeito e entregue nas mãos de algumas pessoas comprometidas com os grupos políticos de Paulo Duarte e Dilmar.
A irresponsabilidade do gestor municipal atingia comentários assustadores ao mesmo tempo em que crescia consideravelmente a lista de cheques sem fundos emitidos por seu próprio punho para despesas pessoais incluindo farras e bebedeiras. 
Uma considerável parcela da população limoeirense andava triste, esperando um milagre ou um fenômeno qualquer que tirasse o município dos maus lençóis em que se encontrava.
Foi captando essa apreensão da população que Ariosto Holanda resolveu promover em Limoeiro do Norte, numa memorável noite nos salões da AABB, um movimento chamado sugestivamente de “Pensando em Limoeiro”.
Como Ariosto sabia que a situação política era por demais delicada e sabendo também que seu nome representava uma enorme fatia de credibilidade junto ao povo, convocou a sociedade Limoeirense para ouvir dele o que estava pensando com relação à gravidade da administração e ao futuro político de Limoeiro.
No seu pronunciamento começou exibindo uma reportagem da Revista Veja[1] sobre um prefeito de uma cidade do sertão pernambucano – Quixaba, a 430 km de Recife – completamente analfabeto e que conseguiu alcançar uma enorme popularidade em razão do incentivo que deu à educação do município, zerando o analfabetismo e, assim, ganhando fama nos noticiários nacionais.
Da forma como começou o seu discurso, colocava nas entrelinhas que estava disposto a apoiar o Careca caso ele viesse a se candidatar, justificando esse apoio através da reportagem da Revista Veja, querendo dizer que não havia problema nenhum para um município ser administrado por um analfabeto.
A presença de Ariosto naquela noite foi causa de uma enorme decepção. Quando se esperava que trouxesse a proposta de um candidato novo, optou por continuar com o atraso para Limoeiro.

Foi a partir daquela noite que o Dr. Ariosto Holanda começou a mostrar ao povo duas faces distintas: uma, o político insensível e a outra o técnico competente. Com seu jeito sério de ser, sempre conseguiu a simpatia dos limoeirenses lhe confiando o voto sem nenhuma cobrança, por outro lado, sempre optou pelo atraso político, mesmo sabendo que sua condição junto ao eleitorado – principalmente naquele momento – era fundamental para mudar a situação crítica do município.
Nunca um político na história de Limoeiro teve tanta aceitação e credibilidade do povo quanto ele.
O discurso socialista que se propusera implantar quando veio buscar votos pela primeira vez em 1990, foi inteiramente desfeito pelas suas atitudes como político bem como o seu primeiro ato demagógico comprovado com a filiação tempos depois no PSDB, partido de direita, para disputar novamente uma vaga para a Câmara Federal em 1994 e naquele ano, por ter conseguido apenas uma suplência, foi convidado por Tasso Jereissati para assumir a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado como uma forma de compensá-lo por não ter se elegido Deputado Federal, permanecendo lá de 1995 a 2002.
Foi ai que se revelou a sua competência e capacidade como técnico. Na qualidade de secretário, implantou uma rede de educação tecnológica no Ceará com 40 Centros Vocacionais Tecnológicos (CVT), dois Núcleos de Informação Tecnológica (NIT) e três Centros de Ensino Tecnológico (Centec) – Sobral, Juazeiro do Norte e Limoeiro do Norte – idealizados como um programa de capacitação humana e educação tecnológica.
Sem deixar de reconhecer o valioso benefício dessa iniciativa, principalmente por defender a educação como base para a inclusão do homem na sociedade, ficamos sem entender o porquê de o Dr. Ariosto ter defendido sempre um modelo político que não se afinava nem um pouco com o seu discurso socialista, tampouco com suas atitudes em relação aos Centec’s. Estranhamente, fez uma mistura do moderno com o arcaico, praticando de um lado, aquilo que considerava ponto fundamental para a socialização do homem, e do outro, fazendo política da forma mais anacrônica e fisiológica que pudesse existir.
Quem conhecia as atitudes de Ariosto Holanda com relação ao processo político em Limoeiro do Norte e o seu pensamento sobre a educação do homem, percebia claramente a mistura que fazia e espantava-se com suas declarações:.
"Se não pensarmos no homem não alcançamos o desenvolvimento: não se distribui renda entre analfabetos, só esmolas. E aqui inclui os analfabetos, que sabem ler e escrever, mas não sabem para que isso lhes serve.” 
(www.estadao.com.br/ciência/noticias/2000/dez)
Com essas palavras, Ariosto criou um terrível paradoxo entre o falar e o pensar, ou seja, de um lado defendendo brilhantemente a educação e criticando o analfabetismo como um grande mal social e do outro pedindo ao seu povo que elegesse um analfabeto para administrar o município.
Juntos ainda, Dilmar e Paulão continuavam encenando para o povo um relacionamento de cordialidade, mas intimamente o que acontecia na verdade era uma desconfiança tão recíproca quanto a falsa impressão de uma concreta amizade.
Em meio às discussões que tratariam da escolha do sucessor de Ademar, os dois não se entendiam e essa falta de harmonia nos entendimentos desencadeou para uma coisa “inacreditável”: o rompimento entre os dois.
O divórcio político entre Paulo Duarte e Dilmar, poderia ter causado estranheza se não fosse de praxe para os políticos limoeirenses viverem entre “tapas e beijos”, numa constante disputa pelo poder.
O impasse surgiu em virtude de Dilmar não abrir mão de sua candidatura por qualquer hipótese mesmo com a discordância irredutível de Paulão, que por sua vez tencionava repetir a dose da eleição passada quando fez todos engolir de goela abaixo o nome de Ademar.
Estando Paulo Duarte certo de que Dilmar não abria mão da condição de candidato, começou a tramar o seu jogo político iniciando uma aproximação com o Careca com algumas conversações no sentido de apoiá-lo na candidatura para prefeito.
Dentro desse contexto convém analisar que cada um dos protagonistas daquele momento político se achava um mais esperto do que o outro. Como o bolo estava ficando cada vez mais fragmentado, tornava-se mais difícil a sua divisão, isso porque o pedaço destinado a cada um não tinha tamanho nem ingredientes suficientes para ganhar uma eleição sozinho, dependendo assim de fatores externos, tipo a viabilização de candidaturas que viessem facilitar ou até mesmo possibilitar a vitória de outrem, como foi o caso de Ademar ter sido eleito, em virtude do rompimento entre Pedro Julião e Careca na eleição passada (1992), criando uma divisão nos votos e sem isso Ademar jamais teria sido eleito.

A exemplo de como agiu em 1982 quando se juntou a Manoel de Castro, Gladstone Bandeira esqueceu tudo o que dissera nos palanques e partiu para uma negociata com Paulo Duarte.
Depois de muitas conversas e conchavos nas caladas da noite, a população estupefata, assistiu numa histórica e memorável noite de 1996 no pátio interno do Hotel Municipal (hoje Secretaria Municipal de Educação Básica) o acasalamento público entre Careca e Paulo Duarte, numa solenidade que contou com grande número de adeptos tanto de um lado quanto de outro. Em meio às clamorosas honras e aplausos os dois se deram as mãos parecendo velhos amigos como a dizer ao povo que esquecessem tudo o que eles falaram na campanha para deputado, quando se digladiaram e jogaram difamações um no outro. Aliás, naquele momento, os dois se mereciam completamente; ambos tinham como artimanhas políticas, bestializar e desdenhar da consciência do povo.
Vale lembrar que as desavenças entre Julião e Careca durante a eleição passada, provocou uma fenda na família “Bandeira” e a situação se agravou quando o Careca, insensível ao rompimento de sua própria família sendo ele foi a causa principal, não se importou em naquele instante juntar-se a Paulo Duarte, tão somente pela ambição de novamente ser eleito prefeito.
Seu irmão, Nauto Bandeira, até então um dos seus sustentáculos políticos, não gostou dessa atitude e magoado, intrigou-se com ele, acusando-o de ter passado por cima inclusive dos laços familiares, desconsiderando a todos e deixando de ser solidário ao próprio Nauto que sofreu fortes perseguições durante algum tempo por parte de Paulo Duarte. Mas o Careca, obcecado pelo poder, optou por satisfazer a sua ambição pessoal e se assim agiu, foi porque sabia que em sendo eleito, todos aqueles que tinham se afastado dele, inclusive os próprios familiares vinham sem dúvidas ao seu encontro. A propósito, certa vez o Careca foi flagrado conversando escorado no balcão de um amigo, comerciante e permissionário de um dos quartos do mercado público, dizendo: “Eu não me preocupo com quem tá brigado comigo agora, mesmo sendo os meus parente, pois quando eu for o prefeito, todos vêm pro meu lado”.

Apesar do espetáculo em que os conhecidíssimos homens públicos eram os atores principais, começaram a surgir as candidaturas postulantes ao cargo de prefeito e nada menos do que seis candidatos colocaram seus nomes para serem votados.
Careca, depois daquela cena, entre abraços e perdões com Paulo Duarte, partiu na frente com sua candidatura esboçando um riso de garbosa vitória. Como parte do acordo, aceitou que Elizete Duarte, irmã de Paulão, fosse candidata a vice-prefeita em sua chapa, visto que não representaria nenhuma ameaça ao seu apetite pelo trono do gabinete da prefeitura.
Acertou mais uma vez Gomide Lima Oeriô, o poeta “Amigo de Limoeiro” que depois de presenciar todas as peripécias do Careca até cair nos braços de Paulo Duarte, desenhou em uma única estrofe o que aconteceu naquele momento, senão vejamos:

Um perdeu as estribeiras
E, batendo os calcanhares,
Chutou as outras "bandeiras",
Que o pau voou pelos ares,
E no final se ajuntou
Com quem dele já zombou
Em todo canto e lugares.

Pra custear a campanha acredita-se que a dupla tenha chegado à uma conclusão bastante irresponsável; conseguir de Ademar que atrasasse a folha de pagamento dos servidores públicos municipais e a partir do mês de agosto de 1996 a prefeitura deixou de fazer pagamento de salários exceto para alguns cargos de confiança.
Tão grande era a ambição do Careca de novamente chegar à prefeitura, que não se importou em concordar com o atraso da folha de pagamento, mesmo sabendo que se fosse eleito os salários atrasados cairiam sob a sua responsabilidade. Mas num gesto de total indiferença e movido pela cegueira de conquistar o poder, não atentou para o fato de que estava tirando de muitos pais de família a única fonte de sobrevivência e de sustentação dos filhos e tudo isso para realizar o seu desejo de voltar a prefeitura.
O palanque do Careca, montado com dinheiro público era o mais “enfeitado” de todos, pois lá estava o Dr. Ariosto Holanda defendendo e pedindo voto para um analfabeto. Também Paulo Duarte, distorcia seu discurso num engenhoso trocadilho para fazer elogios ao Careca, inteiramente “esquecido” do que falara dele em campanhas passadas quando ao invés de elogios dirigia-lhe injúria e difamação. Por último o Careca, totalmente desmemoriado, perdoava Paulo Duarte pelos adjetivos ditos quando estavam em palanques diferentes e disparava o seu desconexo linguajar contra os “adversários”.
Dilmar também entrou na disputa apostando no “carisma” e na popularidade do seu nome, certo de que o povo iria lhe reconhecer como um verdadeiro “líder”. Com a confiança que tinha na aceitação do seu nome, pouca importância deu ao rompimento com Paulo Duarte o que implicou na perda da prefeitura como patrocinadora de sua candidatura, mas essa questão seria superada através dos malabarismos do Dr. Maílson para conseguir dinheiro que custeasse a campanha.
Muito comedido quando se tratava de falar de alguém e sendo essa uma das suas muitas facetas, Dilmar não difamava dos “adversários” para assim passar para os eleitores de que era diferente dos outros. Por outro lado, os seus asseclas se encarregavam de divulgar para a população quem era realmente Paulo Duarte e no dizer deles, um mentiroso que nunca cumpria com nada que prometia. Mauro Costa, por exemplo, foi um desses competentes divulgadores, dizendo-se altamente decepcionado com Paulão a quem Dilmar tinha feito das tripas coração para elegê-lo deputado. Teve quem o visse sentado no fio de pedra do calçamento próximo ao BNB, com os olhos marejados e fitos no céu dizendo: “Tenho fé em Deus que se minha mão tiver vergonha, nunca mais há de votar em Paulão”.

A terceira candidatura surgiu com o nome de Pedro Julião, ressentido com a determinação de Gladstone em não arredar o pé de sua candidatura e também por ter feito um conchavo com Paulo Duarte. Então, foi se aproveitando da insatisfação no seio da família que Julião conseguiu colocar em sua chapa como candidato a vice o próprio Nauto Bandeira, caracterizando-se uma briga séria entre os membros da família. Sabendo ser quase impossível eleger-se, o objetivo maior de Pedro Julião naquele momento, era aumentar o seu patrimônio político para negociá-lo em vindouras eleições como sempre fazia. Nesse caso, acertaram os partidários do Careca quando o consideraram “um candidato laranja”, ou seja, aquele que sem qualquer chance de ganhar, lança seu nome para ocupar espaço político e com um número suficiente de votos para participar de negociações futuras.
Sobre esse argumento, outra vez Gomide Lima Oeriô, o poeta “Amigo de Limoeiro”, escreveu uma estrofe que marcaria na história do município o caso de um político que nunca foi eleito, mas que nunca desistiu de está dentro da disputa, exatamente para manter o seu eleitorado.

Um outro só faz perder,
Mas não arreda do eito.
Candidato ele vai ser
A deputado ou prefeito.
Seja por bem ou por mal
Vai mantendo o capital
Pra investir noutro pleito.

Outra candidatura fruto também de uma insatisfação por não ter conseguido o objetivo de candidatar-se com o apoio da prefeitura foi a do então vice-prefeito Dr. Reuber que recebeu o apoio do PT, confirmando assim, a sua disposição de sempre fazer acordos e alianças a cada eleição.
Em meio aos quatro nomes lançados como candidatos a prefeito, eis que surge o quinto. Tratava-se de Lauro Rebouças Filho “Laurinho”, colocando-se como uma opção diferente de todas aquelas que estavam se propondo naquele momento. Criticando o papel de todos os outros candidatos, que em vez de se unirem em torno de uma candidatura nova resolveram seguir cada um seu caminho, segundo ele, mostrando que nenhum estava realmente pensando no município e no povo, mas insistindo em defender interesses pessoais. Alegando essa falta de respeito para com o eleitor, Laurinho lançou sua candidatura propondo uma opção que desse ao limoeirense o direito de escolher algo novo e pedindo a mesma oportunidade que todos os outros já tiveram e quase nada fizeram, mas que continuavam com a briga infernal pelo poder. Todavia, lembremos que Laurinho, embora com um perfil mais sério, não deixava de fazer parte do mesmo sistema político, tendo sido ele um dos grandes responsáveis pela eleição do Careca em l982.

Uma sexta candidatura aparece, mesmo sem nenhuma expressão política ou qualquer chance de concorrer. Tratava-se do agrônomo Arnaldo Araújo. Como tudo estava esculhambado qualquer um poderia ser candidato, mesmo que não passasse de um deboche perante o povo.

Terminada a eleição, elegeu-se o Careca convencendo-se mais uma vez que sem o apoio da máquina administrativa seria praticamente impossível chegar à prefeitura.

ELEIÇÃO MAJORITÁRIA (PREFEITO)

NOME DO CANDIDATO

VOTOS

%

José de Oliveira Bandeira (eleito)

7.621

29,94%

João Dilmar da Silva

6.431

25,27%

Pedro Julião Bandeira Regis

4.832

18,99%

Lauro Rebouças Filho

3.267

12,84%

Reuber Tadeu Vieira e Silva

3.088

12,13%

José Arnaldo Araújo

212

0,86%

Votação nominal

25.451

100%


 A Câmara de vereadores ficou composta pelos seguintes vereadores:
1. Antônio Cicero Viana de Lima Junior
2. Antônio Conrado Maia
3. Benedito Mendes Cabral
4. Elias Correia Lima
5. Flavio Araújo de Almeida
6. Francisco Gilmar de Castro
7. João Neudes Saraiva Chaves
8. Jose Carneiro da Silva
9. Jose Cirineu Maia
10. Jose Gilton Nunes Alves
11. Jose Gilvan de Moura
12. Jose Gladis de Lima Bandeira
13. Jose Maria de Andrade
14. Jose Valdir da Silva
15. Lucia Baltazar Costa
16. Raimundo Nonato
17. Raimundo Nonato da Costa
18. Raimundo Valdi Chaves
19. Rute Gomes de Meneses Maia
https://apps.tre-ce.jus.br/tre/eleicoes/resultados/Resultado_das_Eleicoes_1996.pdf

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Com o quadro que foi desenhado na campanha de 1996, se assistiu uma dança grotesca dos políticos limoeirenses em busca de um lugar no bolo. Nem é preciso observar atentamente para descobrir que quase todos representavam um mesmo grupo, só que estavam cada um com seu próprio palanque, intencionalmente montado, a fim de mostrar quem tinha mais forças naquele momento. Aquele que fosse eleito alcançaria superioridade sobre os outros e com melhores condições para atassalhar a maior fatia.
Foi de estarrecer os olhos dos eleitores a forma como eles se dividiram. Senão vejamos e analisemos os nomes dos candidatos: Dilmar, que foi vice-prefeito do Careca e se tornou prefeito em 1988 com o apoio deste; Julião, que foi vice-prefeito de Dilmar, indicado por Careca; Dr. Reuber, que era o vice de Ademar; Careca, que recebeu o apoio de Paulo Duarte, que por sua vez já foi aliado de Dilmar.

Fizeram isso porque sabiam e sabem que o povo não participa dos fatos políticos como deve, ficando praticamente alheio ao processo e pouco lhe importa quem seja o eleito. Políticos assim, não se preocupam de que os classifiquem como “farinha do mesmo saco”, para eles é preferível que assim sejam chamados a usar da honestidade para com o povo.
Aquele que em 1982 chegou ao poder através de conchavos e acordos com Manoel de Castro repetiu a dose em 1996, quando “necessariamente”, teve que costurar novos acordos, desta vez com Paulo Duarte, conclusão lógica de que a sua popularidade nunca passou de uma ilusão e para comprovar essa obviedade vamos levar em conta de que quando tentou por duas vezes se eleger sem que tivesse que usar a maquina administrativa, ou seja, o dinheiro do povo, não conseguiu, razão pela qual concluímos de que nunca teve votos suficientes para chegar à prefeitura. Já nas duas vezes em que se elegeu prefeito, juntou-se aos próprios “inimigos” e com eles engendrou os acordos necessários à revelia da população. Se olharmos por esse ângulo, no meu entender o mais verdadeiro, constatamos que a ânsia obstinada do Careca em ser prefeito nada teve a ver com os anseios e as necessidades do povo e os acordos envolvendo o dinheiro público como patrocinador maior, foram sua única forma de chegar ao poder.
Ora, já que se considerava um grande líder – aliás o maior de todos como ele mesmo se autodenominava – então porque necessitou usar meios tão indignos de um homem público para eleger-se? Concluímos que se realmente tivesse em si a liderança primorosamente alardeada, teria sido eleito sem que fosse preciso descer tanto, como aconteceu em ambas as vezes que chegou a prefeitura.
A propósito, o Careca celebrizou uma frase que marcou a sua conduta política para justificar as duas eleições que o fizeram prefeito. Dizia para os amigos que “eleição se ganha através de conchavos e dinheiro e nada mais”, confirmando assim de que ele foi o mais hábil de todos na arte de costurar acordos para chegar à prefeitura.
Dos candidatos que disputaram a prefeitura em 1996, Laurinho e Arnaldo eram um pouquinho diferentes dos outros. Do primeiro, mesmo não podendo omitir a sua origem política, posto que, em sendo irmão de José Hamilton de Oliveira não há dúvidas de que foi partidário de Manoel de Castro e ainda porque em 1982, foi um dos homens fortes na campanha que elegeu o Careca, quando sua esposa a professora Rita de Cássia Freitas Peixoto foi eleita vereadora com expressiva votação.
Já Arnaldo, era o único que não tinha origem política do mesmo grupo surgido a partir de 1982, grupo esse, que implodiu naquele ano, mas que já esteve unido em um mesmo palanque numa troca de mútuos elogios entre eles.
O mais interessante é que aquela não era primeira vez que brigavam e, por algumas vezes, também em palanques diferentes, em vez de elogios trocaram palavrões.
Extremamente desconfiados entre si, exageradamente nepotistas e assistencialistas, dados às rotineiras fofocas e intrigas políticas e pessoais, as “célebres lideranças limoeirenses” sempre agiram conforme as conveniências e em momento algum, chegaram a demonstrar qualquer tipo de escrúpulo em estarem brigados numa eleição e unidos em outra, pois o que contava eram os interesses individuais de cada um e a possibilidade de preservá-los.
O revezamento que eles constantemente vinham provocando, era uma forma de sobrevivência política como bem afirmou em conversas informais, o ilustre limoeirense Padre Francisco de Assis Pitombeira, referindo-se às frequentes trocas de posições a cada eleição: “eles se dividem para se unirem”.
Foi preocupado com esse vai-e-vem de todos eles, ora brigando, ora se abraçando que mais uma vez o poeta Gomide Lima Oeriô, ou seja, o “Amigo de Limoeiro”, escreveu a seguinte estrofe:

E agora em desafio
Vou lhe fazer uma pergunta:
Por que é que o mesmo trio
Ora briga, ora se junta?
É por amor à cidade?
Ou é só por vaidade?
Ou é mesmo fome muita?

O rodízio dos políticos integrantes do grupo que se iniciou em 1982 com a primeira eleição de Gladstone e suas danças para conseguirem o poder se tornou um fato corriqueiro nas campanhas eleitorais, provocando sucessivas e desastrosas administrações montadas em cima de demagogia e de corrupção, através de uma política populista barata e mal engendrada, com interesses voltados para fins meramente pessoais e eleitoreiros.
O mais intrigante e o que mais demonstrava ausência de ideologia e coerência política bem como a ambição pessoal de cada um era a facilidade com que se aviltavam e se digladiavam e a mesma facilidade com que esqueciam as agressões e se juntavam novamente como se nada tivesse acontecido. Por todas as vezes que estiveram no poder, manipularam as opiniões e violaram o voto da maioria dos cidadãos como sendo uma ação relativamente simples, o que garantiu a cada um deles a possibilidade de querer se mostrar como uma opção onde apontava o melhor caminho para o município.
As atitudes encenadas pelos que podemos chamar de pseudo políticos naquele momento buscavam uma justificativa na sentença mineira atribuída a Magalhães Pinto de que "Política é como nuvem. Você olha e ela está de um jeito. Olha de novo e ela já mudou.", significando que em uma eleição, o que foi dito ontem não tem o menor valor hoje, assim como os acordos de hoje, nada valem para o amanhã. O mais interessante é que essas ações se não fossem tão prejudiciais chegariam a ser folclóricas como se normalmente fizessem parte da vida do povo e da política, mas na verdade só podemos traduzir isso como uma falta de coerência e respeito para com o eleitor.
Um resultado digno de relato naquela eleição de 1996 foi a votação obtida por Laurinho. Com uma estrutura financeira muito aquém das outras, bem como sem nenhuma figura de expressão de apoio à sua candidatura, conseguiu 12,84% do total de votantes em um universo de seis candidatos, quando o Careca foi eleito com 29,94% dos votos.
Podemos então considerar que os votos obtidos por Laurinho, representaram uma parcela da população altamente cônscia da necessidade de mudar. Se não se manifestou antes, foi justamente por falta de opção e para termos essa certeza, basta que olhemos os candidatos de todas as eleições passadas – até mesmo antes de 1982 – e vamos observar que todos, sem nenhuma exceção, sempre pertenceram a um mesmo grupo político, ainda mais da forma como eles agiam, brigando em uma eleição e unindo-se em outra. A vitória do Careca deixou uma grande certeza para Dilmar: não teve votos suficientes para ganhar uma eleição, ou seja, a sua representação entre os eleitores, não chegou a 30%, resultado obtido pelo careca para que fosse eleito, demonstrando que o seu tão alardeado carisma não era tanto quanto se imaginava.

[1] “É Triste Ser Analfabeto”, Revista Veja, nº 1435, 06 de março de 1996, págs. 23 e 24.

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